CONVERSAS À MESA (TISCHREDEN) PT. 28/47 - DA TENTAÇÃO E TRIBULAÇÃO

Categoria: Conversas à Mesa [Tischreden]
Imagem: Martinho Lutero (no centro) - eBiografia
Publicado: 14 de Fevereiro de 2023, Terça Feira, 13h17

DCXXIX.
Aquele que disputar contra o diabo no tocante ao pecado e à lei sem a Palavra da Graça e da oração, certamente perderá; portanto, livre-se dele logo. Pois o diabo está armado contra nós com a espada de Golias e revestido de sua armadura; isto é, ele tem a seu favor as nossas próprias consciências que testemunham contra nós mesmos devido a transgressão que praticamos contra os mandamentos de Deus; então o diabo tem uma vantagem muito grande contra nós. O diabo muitas vezes me ataca alegando que minha doutrina é uma ofensa e muito mal procedida, e assim ele me deixa perplexo com veemência. E embora eu lhe dê uma resposta: O bem é levantado dessa maneira mostrando a graça de Deus ser verdadeira; mas ele é um espírito tão ágil e um retórico tão astuto que, como um mestre, pode perverter isso em pecado. Ele nunca foi tão feroz e cheio de raiva como agora. Eu me sinto bem com isso.

Mas quando me lembro de mim mesmo me apegando ao Evangelho, e dou de cara com ele, então eu o refuto e o venço em todos os seus argumentos; algumas vezes eu chego a falhar. Ele diz: A lei também é a Palavra de Deus; por que então o Evangelho é sempre objetado contra mim? Eu digo: Verdade, a lei é a Palavra de Deus, mas é tão diferente do Evangelho quanto o céu da terra; pois no Evangelho, Deus nos fornece a sua graça e amor apresentando seu Filho unigênito para nos livrar do pecado, da morte e acrescentar justiça e vida eterna para nós; nisso eu tenho certeza, e Deus não é nenhum mentiroso. Deus também deu a sua lei para outros aspectos de uso e propósito.

Os meus ensinos e pregações faço abertamente, em público, à luz do dia, não em um lugar afastado. Eu instruo da mesma maneira o Evangelho, o batismo e a oração do Senhor. Aqui está Cristo e não posso negar o seu Evangelho, pois é o fundamento da minha causa, etc; No entanto, o diabo com sua astúcia, se aproxima tão perto que o suor da angústia escorre em mim.

Assim, São Paulo foi constrangido a se defender em Filipos, quando judeus e gentios o atingiram nos dentes alegando que São Paulo havia perturbado a cidade. E em Tessalônica eles alegavam que São Paulo virou o mundo de cabeça pra baixo por desobedecer os decretos de César. E em Cesaréia disseram que São Paulo era um sujeito pestilento que promovia motim entre os judeus e os gentios. Assim também o diabo incitou os judeus contra Cristo, acusando-o de rebelião por ter proibido de pagar tributo a Cesar, e que levantou blasfêmias por ter se autodeclarado Filho de Deus. Então eu digo a Satanás: Assim como você foi confundido por Cristo e por São Paulo, da mesma maneira, essa confusão irá com você, senhor diabo, por se intrometer comigo.

DCXXX.
Todo peso da mente e melancolia vêm do diabo; principalmente esses pensamentos que diz que Deus não é misericordioso, etc.; Quem quer que você seja, possuído por esses pensamentos tão pesados, tenha certeza que tais pensamentos são obras do diabo. Deus enviou seu Filho ao mundo não para aterrorizar, e sim para confortar.

Portanto, tenha bom animo e acredite que você não é filho de uma criatura humana, mas sim de Deus através da fé em Cristo Jesus, cujo nome você foi batizado; Saiba que a lança da morte não pode entrar em ti; ele não tem direito algum sobre você; muito menos pode te ferir ou te prejudicar, pois o diabo é eternamente esmagado por Cristo.

DCXXXI.
É melhor um cristão triste do que seguro como as pessoas deste mundo estão. Para aquele que está sempre com medo, saiba que há um céu com um Deus gracioso, por amor de Cristo; como diz o Salmo: “O prazer do Senhor está naqueles que O temem e confiam em sua misericórdia.”

Existem dois tipos de tribulações: o de espírito e o da carne. Satanás atormenta a consciência com mentiras, pervertendo o que é feito com retidão e de acordo com a Palavra de Deus; mas o corpo e a carne, ele atormenta de outras maneiras.

Nenhum homem deve se impor ou adotar a tribulação, como é feito no Papado; mas se a cruz ou a tribulação vier sobre ele, então deixe-o sofrer pacientemente, pois é bom e proveitoso para ele.

DCXXXII.
Lutero tinha sido informado sobre uma pessoa que foi ferozmente atormentada em sua consciência por não ter encontrado em si mesma uma justiça com retidão, que ela não é tão justa conforme exigido na lei de Deus, e que ao orar, sempre se sentia blasfemando contra Cristo. Lutero disse: a blasfêmia contra Deus é dupla; um é ativo ou operativo, quando a pessoa blasfema voluntariamente contra Deus; a outra é uma blasfêmia constrangida contra Deus, ou seja, passiva, quando o demônio nos possui com más cogitações mesmo contra a nossa própria vontade, às quais desejamos resistir. Contra essas coisas, Deus quer que nos exercitemos até o fim; não podemos ficar roncando na preguiça, mas nos esforçar e orar contra tais pensamentos. Desta maneira, tais coisas desaparecerão com o tempo, especialmente no nosso último momento; pois o Espírito Santo está presente no nosso lado, afastando o diabo, e tornando a nossa consciência doce, tranquila e pacífica. Portanto, para a doença espiritual dessa pessoa, deixe-a tomar esse remédio; que ela não precisa ficar preocupada, mas tenha bom consolo, confie em Deus e abrace na sua Palavra; o diabo logo desistirá de provocar.

Com relação a essa tribulação onde ela não consegue encontrar uma justiça plena em si mesma, deixe-a saber que nenhuma criatura humana a encontra nessa vida; é algo totalmente angelical que cairá sobre nós na vida futura. Aqui devemos nos contentar com a justiça de Cristo, que ele mereceu plenamente por nós com sua vida inocente e imaculada.

DCXXXIII.
Cristo disse a mulher adúltera: “Nem eu também te condeno; vai-te e não peques mais.” Ao assassino, ele disse: “Hoje estarás comigo no Paraíso.” Mas para os escribas e fariseus que se colocaram contra a justiça do Evangelho, Cristo disse: “Ai de vós.”

Quando alguém na fraqueza nega a Palavra de Deus, como muitos estão fazendo neste momento sob o príncipe George, não é um pecado contra o Espírito Santo. Pedro pecou negando Cristo, mas não contra o Espírito Santo. Ao contrário de Judas que persistiu em pecar; ele não se arrependeu e permaneceu endurecido.

DCXXXIV.
É impossível para um coração humano, sem cruzes e tribulações, pensar em Deus.

DCXXXV.
Nem todos conseguem suportar tribulações de igual maneira; alguns são mais capazes de suportar um golpe do diabo como eu, Philip Melanchthon e João Calvino.

DCXXXVI.
Davi, sem dúvidas, sofreu com demônios piores que nós, pois ele não poderia ter recebido grandes e gloriosas revelações sem grandes tribulações. Assim como Davi fez salmos, nós também faremos nossos salmos e cantaremos o melhor que pudermos para a honra de nosso Senhor Deus, e para ofender e zombar da cara do diabo.

DCXXXVII.
Quando Davi cantou sua canção: “Óh meu filho Absalão, meu filho, meu filho Absalão, se Deus tivesse morrido por ti, óh Absalão, meu filho, meu filho…”, etc. Ah! Quão triste e perplexo era esse homem. As próprias palavras denotam que sua dor no coração era excessiva.

O bom e santo rei teve inúmeras tribulações e cruzes que obscureciam completamente as promessas feitas por Deus a ele. Eram tribulações pesadas e terríveis. Mas Davi se apegou com firmeza na Palavra nesses tempos de tais provações e aflições. Óh! Isso é de valor inestimável

DCXXXVIII.
A igreja cristã justa e verdadeira luta não apenas contra a carne e sangue, mas também contra a maldade espiritual nos lugares extremos. O combate espiritual é pesado e perigoso; carne e sangue tiram somente o material, isto é, esposa e filhos, casa, terra e tudo o que é temporário; mas o mal espiritual tira a alma, a vida eterna e a salvação.

DCXXXIX.
O Senhor nosso Deus é um Deus de corações humildes e perplexos que estão passando por necessidades, tribulações e perigos constantes. Se fôssemos fortes, seríamos orgulhosos e arrogantes. Deus mostra sua ira em nossa fraqueza; não apagará o linho reluzente, e nem esmiuçará a cana rachada.

DCXL.
A tribulação da fé é o tormento mais pesado, pois a fé deve superar todas as outras tribulações; de modo que, se a fé for frustrada, então todas as outras tribulações cairão sobre a criatura humana; mas se a fé erguer a cabeça e for sã e saudável, então todas as outras tribulações enfraquecerão e diminuirão. Essa tribulação da fé foi aquele espinho que São Paulo sentiu em sua carne e espírito. Davi também estava cheio de tais tribulações quando fez este salmo: “Senhor, não me repreendas na tua ira.” Sem dúvida ele preferia ter sido morto por uma espada, do que sofrer com a ira de Deus.

DCXLI.
Pensamentos pesados acarretam em doenças físicas; quando a alma está oprimida, o corpo também passa a ficar. Agostinho tinha dito a respeito: “Anima plus est ubi amat, quam ubi animat”. Quando as cogitações, as tristezas e as paixões se superabundam o corpo enfraquece e, sem a alma, o corpo morre como um cavalo sem condutor. Mas quando o coração está em repouso e sossegado, então o corpo está bem cuidado. Portanto, devemos abandonar e resistir aos pensamentos ansiosos de qualquer maneira possível.

DCXLII.
Nenhuma criatura humana possui a vida isenta de descontentamento; cada um tem suas tribulações e, ao invés de lutar contra elas, acabam procurando inquietações para si mesmas. Nenhum homem fica satisfeito com o que Deus lhe oferece.

DCXLIII.
Ah! Como eu gostaria de morrer agora, pois estou fraco e exausto, mas com um coração e uma consciência alegres e tranquilos. Eu tenho certeza que assim que eu estiver novamente com boa saúde, não terei paz e nem descanso, mas sim tristeza, cansaço e tribulações. Nem mesmo São Paulo, aquele grande homem, não poderia estar isento de tribulações.

DCXLIV.
Quando as tribulações espirituais se aproximam, costumamos dizer: maldito o dia em que nasci; e começamos a nos aterrorizar. Em tais tribulações estava o nosso bendito Salvador Cristo, lá no jardim, quando disse: “Pai, afaste este cálice de mim”. Aqui a vontade era contra a vontade, mas ele se voltou imediatamente de acordo com a vontade de seu Pai e foi consolado por um anjo. Cristo, que através dos nossos pecados foi atormentado, é o melhor mediador e advogado junto a Deus em nossa tribulação. Ele é o presidente enquanto nós somos apenas respondentes, se caso apenas permitirmos que Ele governe. Parece que Deus está zangado conosco quando estamos mergulhados na tribulação; no entanto, em meio ao arrependimento e a fé, descobriremos que a graça e a bondade de Deus para conosco está acima da tal ira. Então vamos atender pacientemente ao descanso de Deus e permanecer constantemente na esperança.

DCXLV.
No dia 8 de agosto de 1529, Lutero e sua esposa estavam com febre. Com problemas de disenteria, ciática e uma dúzia de outras doenças, ele disse: Deus me tocou gravemente o que me fez ficar impaciente, mas Deus sabe de todas as coisas, muito melhor que nós. Nosso Senhor é como um impressor que coloca as letras ao contrário para termos o trabalho da leitura; quando formos impressos na vida futura, leremos tudo claro e direto. Enquanto isso, devemos ter paciência.

A tribulação é uma escola justa e um exercício para carne e osso. A maioria dos versículos que encontramos nos Salmos falam de tribulações, perplexidades, tristezas e problemas; é um livro de tribulações.

DCXLVI.
Cristo recebeu o ladrão na cruz, e também Paulo depois de tantas perseguições e blasfêmias. Então nós não temos motivos para duvidar. E, de fato, a salvação está ao nosso alcance dessa maneira. No entanto, embora não tenhamos motivos para temer a ira de Deus, pelo velho Adão é necessário temer; pois não podemos nos apegar à graça e à misericórdia de Deus como deveríamos. Ele tinha apenas as primeiras seis palavras no credo: “Eu creio em Deus Pai” que estavam muito acima da sua sabedoria, razão e naturalidade.

DCXLVII.
O diabo nos atormenta no lugar onde somos mais fracos. No Paraíso, ele caiu não sobre Adão, mas sobre Eva. Geralmente chove onde antes estava úmido o suficiente.

Quando alguém é possuído pela dúvida que, embora o nome do Senhor é invocado e, mesmo assim, ele sente que não está sendo ouvido, sentindo que Deus desviou dele o seu coração devido a sua ira e cogitações pelas quais sofremos e que são forçadas sobre nós, ele deve armar-se com a Palavra de Deus para batalhar contra tais dúvidas e tormentos, pois Deus nos ouve atentamente. Quando e como Deus o ouvirá, isso não importa; lugar, tempo e pessoa são coisas acidentais; a substância e a essência são a promessa.

DCXLVIII.
Muitas vezes precisei conversar até com uma criança durante as minhas tribulações a fim de expulsar os pensamentos com os quais o demônio lança em mim; e isso me ensina a não me gabar achando que de mim mesmo eu possa me ajudar sem a força de Cristo. As vezes preciso de alguém para me ajudar, pois em todo o seu corpo não há tanta teologia quanto eu tenho em um dedo.

DCXLIX.
Nessa vida existem muitos graus diferentes de tribulações porque as pessoas são diferentes. Se uma pessoa passasse pela tribulação que passei, provavelmente ela teria morrido; enquanto eu não teria suportado as bofetadas que São Paulo levou, e nem São Paulo as tribulações que Cristo sofreu. A maior e mais pesada dor é quando alguém morre em um piscar de olhos. Mas aqui não devemos contestar, e sim nos dirigir ao julgamento de Deus.

DCL.
Quando sou assaltado por pesadas tribulações, eu chego a correr para os meus porcos em vez de ficar sozinho. O coração humano é como uma mó em um moinho; quando você coloca trigo embaixo dele, ele mói e esmaga até virar farinha; se você não colocar o trigo, ele ainda mói, mas logo depois se desgasta. Dessa maneira, o coração do homem, mesmo que esteja ocupado com algum trabalho, acaba deixando espaço para o diabo que se intromete trazendo consigo toda uma série de maus pensamentos e tribulações que oprimem o coração.

DCLI.
Nenhum papista se lançará nas chamas por sua doutrina, ao contrário do nosso povo que prontamente se encontra com o fogo e com a morte seguindo o exemplo dos santos mártires, Santa Inês, Santa Ágata, São Vicente, São Lourenço, etc. Somos todos ovelhas prontas para o matadouro. Outro dia, lá em Paris, dois nobres e dois magistrados foram queimados por causa do Evangelho. O próprio rei (Francisco I) ateou fogo nos feixes.

DCLII.
Minhas tribulações são mais necessárias para mim do que comida e bebida; preciso aprender a me acostuma-las e a suporta-las.

Se Satanás não tivesse me atormentado tanto, eu não teria sido um inimigo tão grande para ele. As tribulações nos protegem do orgulho e, com isso, aumentam o reconhecimento de Cristo e dos benefícios de Deus. Pois desde o momento que passei a sofrer com as tribulações, Deus passou a me dar vitória diante dessa vida confusa, amaldiçoada e blasfema que vivi no papado. Deus trabalhou de uma tal maneira que nem o imperador e nem o papa foram capazes de me suprimir, e o diabo vem até a mim com todas as suas armadilhas, mas a força de Deus se apresenta em minha fraqueza.

DCLIII.
Nossas dúvidas e tribulações com as quais o diabo nos atormenta precisam ser condenadas; da mesma maneira quando alguém condena um cão feroz passando silenciosamente por ele, o cão não apenas desiste de morder mas também de latir; mas quando alguém enfurece o cão feroz jogando algo nele, então ele avança e morde brutalmente. Dessa maneira, quando o diabo vê que o tememos, ele não cessa de nos atormentar.

DCLIV.
Uma mulher em Eisenach estava muito doente tendo sofrido convulsões horríveis que nenhum médico foi capaz de curar, pois era uma obra do diabo. Ela teve desmaios e umas quatro convulsões, cada um durando em torno de três ou quatro horas. Suas mãos e pés estavam dobrados em forma de chifres; ela estava arrepiada de frio; sua língua estava áspera e seca; seu corpo bastante inchado. Ela vendo Lutero que foi visitá-la ficou tão feliz que se levantou e disse: Ah! Meu amado pai em Cristo, tenho um fardo pesado sobre mim, ore a Deus por mim; e então ela caiu em sua cama novamente. Diante disso, Lutero suspirou e disse: “Deus te repreenda, Satanás, e te ordene que deixe essa criatura piedosa em paz!” Então, voltando-se para os presentes, Lutero disse: “Ela está atormentada pelo diabo no corpo, mas a alma está segura e preservada; portanto, demos graças a Deus e oremos por ela.” E assim todos rezaram em voz alta a oração do Senhor. Em seguida, Lutero concluiu com essas palavras: “Senhor Deus, Pai Celestial! O Senhor nos orientou a orar pelos enfermos, então nós te rogamos, por Jesus Cristo, o único Filho amado, que livre a tua serva dessa doença e das mãos do diabo. Poupe, óh Senhor, a sua alma que, juntamente com o seu corpo, o Senhor comprou e redimiu do poder do pecado, da morte e do diabo.” E a enferma disse: “Amém”. Na noite seguinte ela descansou, e no dia seguinte ela foi graciosamente liberta de sua doença e enfermidade.

DCLV.
Uma carta escrita por Lutero ao Doutor Benedict Paul cujo filho morreu recentemente devido a uma queda do alto de uma casa: Embora não seja proibido em nenhum lugar nas Sagradas Escrituras em lamentar a morte de um ente querido, não tivemos muitos exemplos de piedosos lamentando a morte de um ente querido, mas existe sim uma medida de tristeza e luto. Então, querido doutor, enquanto você faz bem em lamentar a morte de seu filho, não deixe a sua dor exceder a medida de um cristão em recusar a ser consolado. Eu gostaria que você, primeiro, considerasse que foi Deus quem deu aquele filho para você, e assim como deu Ele também te tirou; em segundo lugar, eu gostaria que você seguisse o exemplo daquele homem justo e piedoso, Jó, aquele que perdeu todos os seus filhos, todas as suas riquezas e bens, e ainda disse: “Recebemos o bem na mão do Senhor e não receberemos o mal? A mão do Senhor o tirou, bendito seja o nome do Senhor”, etc. Ele considerou corretamente que tanto o bem quanto o mal vêm do Senhor; da mesma maneira você também; então você verá que existem muitos benefícios maiores deixados por Deus para você do que o mal que você sente agora. Mas você olha agora apenas para o mal que é a morte do seu filho; e, enquanto isso, acaba esquecendo do tesouro glorioso que Deus lhe guardou no verdadeiro conhecimento de sua Palavra com uma consciência boa e tranquila, que por si só consegue superar todo o mal que pode acontecer com você; Por que se atormenta com a morte do seu filho? Eu admito que a perda é grande e pesada, isso não é novidade; você não está sozinho nisso, pois tem companheiros que tiveram infortúnios semelhantes. Abraão teve muita tristeza no coração a respeito de seu filho enquanto ainda vivia do que se ele estivesse morrido. Como você pensou em seu coração quando, com sua palavra nua, cortaria a cabeça de seu próprio filho? O que acha de Jacó quando ele foi informado de que seu amado filho, José, foi despedaçado por feras selvagens? Ou que pai ficaria perplexo como Davi que foi perseguido e expulso do seu reino pelo seu filho Absalão, e quando este mesmo filho durante a rebelião, foi morto e condenado? Sem dúvida o coração de Davi carregava um grande pesar naquele momento. Portanto, quando você contemplar e reconhecer tais exemplos de pessoas tão iluminadas, você vai perceber que essa tristeza no seu coração não é nada comparável à deles. Então saiba, amado irmão, que a misericórdia de Deus é maior que nossas tribulações. De fato, você tem motivos para lamentar como pensa, mas nada é mais do que açúcar misturado com vinagre; seu filho está muito bem provido; ele vive agora com Cristo; Oh! Quisera Deus que eu também tivesse terminado meu curso; Eu não desejaria estar aqui novamente. Seu sofrimento é apenas uma cruz corporal. Você é um bom doutor que ensina essa arte aos outros; faça uso disso você mesmo agora; coloque-o em prática; definir, dividir, concluir, distinguir o que é espiritual e o que é corporal.

DCLVI.
Se caso Satanás não deixar de te atormentar, então suporte com paciência segurando nas mãos e nos pés sem desânimo, como se não houvesse fim, e permaneça corajosamente na Graça de Deus; pois saiba que Satanás não consegue realizar ataques repentinos achando que vai ganhar por meio da astúcia; ele persiste em te irritar e te atormentar para te deixar fraco e cansado, como diz no livro de Salmo: “Muitas vezes eles me afligiram desde a minha juventude; mesmo assim não prevaleceram contra mim,” etc. Então esteja plenamente certo de que esse jogo com o diabo, Deus com todos os seus anjos se deleita e se alegra; e tenha certeza de que seu fim será abençoado, feliz e encontrará o conforto eterno.

DCLVII.
No que diz respeito a predestinação, é melhor começar por baixo, em Cristo, pois então ouvimos e encontramos o Pai; pois todos aqueles que começaram já topo acabaram quebrando seus pescoços. Eu tenho sido atormentado com tais cogitações que envolve predestinação; Eu precisaria saber como Deus pretendia lida comigo, etc. Mas, enfim, Deus seja louvado! Eu os deixei limpo; Agarrei-me novamente à Palavra revelada por Deus; no mais alto eu não fui capaz de trazer, pois uma criatura humana nunca consegue buscar a vontade celestial de Deus; este Deus se esconde para confundir o diabo. A vontade revelada por Deus o diabo aprendeu conosco, mas Deus reserva sua vontade secreta para si mesmo. Basta-nos aprender a conhecer Cristo na sua humanidade na qual o Pai se revelou.

DCLVIII.
No décimo dia, Cristo voltou para Jerusalém e foi morto no décimo quarto dia. Suas tribulações eram os pecados do mundo inteiro, da ira e da morte de Deus, das quais todos deveriam temer. Mas antes que ele pessoalmente tivesse carregado o pecado por nós, ele era um homem de dores e familiarizado com o sofrimento; suas tribulações diziam a respeito do seu trabalho doloroso que ele sabia que seria gasto em vão na sua própria nação, pois os judeus, o povo que ele chorou amargamente, não reconheciam o tempo de sua visitação.

DCLIX.
Os maiores pecados são cometidos quando as pessoas estão sozinhas do que quando estão em sociedade. No paraíso, quando Eva caminhava sozinha, o diabo a enganou. Em lugares solitários acontecem assassinatos, roubos, adultérios, etc.; pois é na solidão onde o diabo arruma o seu lugar para enganar as pessoas. Mas aquele que está em uma companhia honesta tem vergonha de pecar, ou pelo menos não tem oportunidade para isso; e, além disso, nosso Salvador Cristo prometeu: “Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, eu estarei no meio deles.”

Quando o rei Davi estava sozinho, entediado e não saía para as batalhas, ele caiu em adultério e assassinato. Eu mesmo reconheço que os maiores pecados que cometi foi quando eu estava sozinho. Deus criou a humanidade para a comunhão, e não para a solidão. O que é claramente comprovado por este forte argumento: Deus, na criação do mundo, fez o homem e a mulher, para que o homem não estivesse sozinho.

DCLX.
Não há registros históricos de um humano oprimido com tanta tristeza a ponto de suar sangue, por isso que a história de Cristo é maravilhosa; nenhum homem consegue entender o que é esse suor de sangue. E é algo maravilhoso de como um Deus da graça e da ira, da vida e da morte, esteja tão entristecido a ponto de buscar consolo dos pobres e miseráveis pecadores dizendo: Ah, discípulos amorosos! Não durmam, fiquem acordados mais um pouco e conversem uns com os outros para que pelo menos eu possa ouvi-los falando sobre mim. Aqui o Salmo foi corretamente aplicado quando diz: “Tu o fizeste um pouco menor do que os anjos”, etc. Ah, Salvador Cristo Jesus, pelo peso imensurável que estava em suas costas inocentes; ou seja, os pecados de todo o mundo contra os quais, sem dúvida, ele orou: Óh Senhor, não me repreendas na tua ira e nem me castigues no teu desagrado”.

 

Fonte: CRTA - Center for Reformed Theology and Apologetics - reformed.org
Tradução: Marcell de Oliveira


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