CONVERSAS À MESA (TISCHREDEN) PT. 20/47 - DO ANTICRISTO


Categoria: Conversas à Mesa [Tischreden]
Imagem: Martinho Lutero (no centro) - eBiografia
Publicado: 27 de Janeiro de 2023, Sexta Feira, 15h42

CCCCXXVI.
O Anticristo é o papa e o turco juntos; um animal feroz cheio de vida deve ter corpo e alma; a alma do anticristo é o papa, seu corpo é o turco. Este último persegue e assalta corporalmente a igreja de Deus; já o primeiro além de afetar corporalmente também afeta o espírito da igreja de Deus com enforcamento, queimas, assassinatos, etc. Mas, assim como no tempo dos apóstolos, a igreja foi vitoriosa sobre os judeus e romanos, agora ela manterá firme e forte contra a hipocrisia e a idolatria do papa, e a tirana devastadora dos turcos.

CCCCXXVII.
“E o rei fará conforme a sua vontade, e ele se exaltará e se engrandecerá sobre todos os deuses, e falará coisas maravilhosas contra o Deus dos deuses, e prosperará até que a indignação seja cumprida: pois isso está determinado e será feito. Ele não respeitará o Deus de seus pais e nem a vontade das mulheres, não respeitará nenhum deus e se engrandecerá acima de tudo.”

Essa profecia, como todos os doutores concordam, aponta diretamente para o anticristo sob o nome de Antíoco; pois o Anticristo não considerará nem Deus e nem o amor das mulheres, ou seja, o matrimônio. Esses dois o Anticristo condena na terra – Deus, ou seja, religião, e a humanidade. Ele não considerará as mulheres, isto é, ele condenará o governo temporal e doméstico, as leis, a jurisdição, os imperadores e os reis; pois é através das mulheres de onde vem as crianças e são criadas para a perpetuação da humanidade e o reabastecimento do mundo; Ou seja, as mulheres sendo rejeitadas também é rejeitado o governo temporal e doméstico, as leis, as ordenanças e governantes.

Daniel foi um profeta extremamente excelente e importante a quem Cristo amou e disse: Quem lê, entenda. Ele falou do anticristo perseguidor tão claramente como se tivesse sido uma testemunha ocular disso. Leia todo o capítulo 11. Aplica-se à época em que o imperador Calígula e outros tiranos governavam; diz distintamente: “Ele plantará os tabernáculos de seu palácio entre os mares, na gloriosa montanha sagrada”; isto é, em Roma, na Itália. O turco também governa entre dois mares, em Constantinopla, mas não é uma montanha sagrada. Ele não honra ou promove a adoração de Maosim, nem proíbe o matrimônio. Portanto, Daniel aponta diretamente para o papa que faz as duas coisas com grande ferocidade. O profeta diz ainda: “Ele também será abandonado por seu rei.” Já chegou a esse ponto, pois vimos os reis e príncipes cortando laços com ele. Quanto as formas de religião sob o papa e o turco, não há diferença, exceto em algumas cerimônias; o turco observa o mosaico, o papa as cerimônias cristãs – ambos os sofisticam e os falsificam; pois assim como o turco corrompe o banho e a limpeza em mosaico, o papa corrompe o sacramento do batismo e da ceia do Senhor.

O reino do Anticristo é descrito também na revelação de João, onde diz: “E foi-lhe permitido fazer guerra aos santos e vencê-los.” Isso parece ser uma profecia relacionada ao turco, e não ao papa, mas devemos em nossas pesquisas entender as abominações e a tirania do papa em aspectos temporais. É ainda dito em Apocalipse: “Será por um tempo, e tempos, e meio tempo.” Aqui está a questão: O que é um tempo? Se o tempo for entendido como um ano, a passagem significa três anos e meio, e atinge o Antíoco que por tanto tempo perseguiu o povo de Israel, mas por fim morreu em sua própria corrupção. Da mesma maneira, o papa também será destruído; pois ele começou seu reino, não pelo poder ou autoridade divina, mas por superstições e umas interpretações forçadas de algumas passagens das Escrituras. O papado foi construído sobre uma fundação que trará sua queda. Daniel profetiza assim: “E por meio de sua política, ele fará com que a astúcia prospere em seu controle; mas ele será quebrado sem nenhum controle.” Isso se refere especialmente ao papa, pois todos os outros tiranos e monarcas caem por poder e forças temporais. No entanto, pode atingir tanto o papa quanto o turco. Ambos começaram a reinar quase ao mesmo tempo sob o imperador Focas que assassinou seu próprio mestre, o imperador Maurício, com sua imperatriz e jovens príncipes; isso foi quase novecentos anos atrás. O papa começou a governar espiritualmente a igreja ao mesmo tempo em que Maomé fundou sua fortaleza islâmica; o reino temporal do papa durou apenas trezentos anos, pois ele atormentou e perseguiu reis e imperadores. Não consigo definir ou compreender bem essa profecia: “Um tempo, tempos e meio tempo.” Não sei se refere ao turco que começou a governar com a tomada de Constantinopla em 1453, oitenta e cinco anos atrás. Se eu calcular um tempo como a idade de Cristo (trinta anos), essa expressão significaria cento e cinco anos, e o turco ainda teria vinte e cinco anos de balanço pela frente. Bem, Deus sabe como é e como ele livrará aqueles que são dele. Não nos irritemos com a busca do conhecimento. Arrependamo-nos e oremos.

Vendo que o papa é o anticristo, acredito que ele seja um demônio encarnado. Assim como Cristo foi verdadeiro Deus encarnado, o anticristo é um demônio encarnado. Também é verdade o que dizem sobre o papa, que ele é um deus terrestre – pois ele não é um deus real e nem um homem real, mas as duas naturezas misturadas.

Ele se autodenomina um deus terreno, como se o único Deus verdadeiro e Todo-Poderoso não estivesse na terra! Verdadeiramente o reino do papa é um ultraje horrível contra o poder de Deus e contra a humanidade; uma abominação da desolação que está no lugar santo. É uma blasfêmia monstruosa para um homem, uma criatura humana, presumir estar acima de Deus. Se tivesse ocorrido entre os gentios, antes da vinda de Cristo, não seria algo tão maravilhoso. Mas, embora Daniel, o próprio Cristo e seus apóstolos, Paulo e Pedro, tenham nos alertado sobre a besta cheia de veneno e pestilência, ainda assim nós, cristãos, somos tão estúpidos e loucos por adorar e venerar todos esses ídolos e acreditar que ele é o senhor do mundo inteiro, como herdeiro de São Pedro; considerando que nem Cristo e nem mesmo São Pedro deixaram qualquer sucessão aqui na terra.

O papa é a última chama da lamparina que se apagará e logo se extinguirá, o último instrumento do diabo que troveja e ilumina com espada e touro, fazendo guerra pelo poder e pela força dos outros, como diz Daniel: “Ele é poderoso, mas não pela sua própria força.” Foi afirmado que o papa tem mais poder em um dedo do que todos os príncipes da Alemanha; mas o espírito da boca de Deus se apoderou daquela prostituta desenvergonhada e surpreendeu muitos corações de um modo que não o consideram mais; uma coisa que nenhum imperador, com espada e poder, foi capaz de realizar. O diabo despreza essas armas, mas quando ele é atingido pela Palavra de Deus, então o papa se transforma em uma papoula e uma quarta flor.

CCCCXXVIII.
Acredito que a palavra Papa vem da palavra Abba, repetida duas vezes, que significa pai dos pais. Antigamente, os bispos eram chamados de papa; Jerônimo, escrevendo para Agostinho, que era bispo de Hipona, o chama de Santo Papa; e na lenda de São Cipriano, mártir, lemos que o juiz lhe perguntou: És tu o Cipriano a quem os cristãos chamam de papa? Parece-me ter sido um termo aplicado a todos os bispos. As crianças chamam seus pais de papa; os bispos eram os pais espirituais do povo.

Quem, trinta anos atrás, teria a ousadia de dizer sobre o papa o que agora dizemos sobre ele? Ninguém se atreveu a expressar-se a respeito dele a não ser na veneração e súplicas.

CCCCXXIX.
De onde vem essa ideia que os papas fingem que são eles que formam a igreja, quando, ao mesmo tempo, são inimigos ferrenhos da igreja e não têm conhecimento, certamente nenhuma compreensão, do Santo Evangelho? Papa, cardeais, bispos, nem uma alma leu a Bíblia; é um livro desconhecido para eles. São um bando de miseráveis glutões, ricos, chafurdando na riqueza e na preguiça, descansando tranquilamente em seu poder e nunca, em nenhum momento, pensando em cumprir a vontade de Deus. Os saduceus eram infinitamente mais piedosos que os papistas, de cuja santidade Deus nos preserva. Que ele nos preserve também da segurança que engendra a ingratidão, o desprezo a Deus, a blasfêmia e a perseguição às coisas divinas.

CCCCXXX.
Alguns falam que os sinais e as maravilhas que anunciarão a vinda do Anticristo, quando ele se apresentar antes do julgamento final, estará armado com fogo para derrubar todos os que tentarem se opor à ele. O Dr. Luther observou; Estas são parábolas que em certos pontos estão de acordo com as profecias de Daniel; pois o trono do papa é um trono de chamas e o fogo é o seu braço, assim como a cimitarra é do turco. O Anticristo ataca com fogo e será punido com fogo. O vilão agora está cheio de medo, agachado atrás de suas montanhas e se submetendo a coisas contra as quais até então ele teria lançado seus raios e trovões.

CCCCXXXI.
No dia 8 de agosto chegou uma carta de Bucer relatando que o concílio de Viena havia terminado, e que os cardeais haviam voltado para suas casas, e o evangelho havia sido recebido com entusiasmo em Piacenza e Bolonha. O papa, enfurecido com o resultado, mandou chamar um alemão chamado Corfentius a quem lhe foi transmitido um salvo-conduto; entretanto, quando Corfentius chegou a Roma, ele foi capturado e jogado no rio Tibre. O Dr. Luther observou: Tal é a boa fé dos papistas italianos! Feliz o homem que não confia neles. Se os homens de Deus, que pregam o evangelho na Itália, permanecerem firmes, haverá muito derramamento de sangue. Veja que armadilhas estão armadas para nós aqui na Alemanha; não há uma única hora em que possamos nos considerar seguros. Se Deus não tivesse cuidado de nós, já deveríamos ter sucumbido há muito tempo.

CCCCXXXII.
Alguém perguntou como São Tiago esteve em Compostela. O Dr. Martinho responde: Da mesma maneira como os papistas contam dezesseis apóstolos, visto que Jesus Cristo tinha apenas doze. Em muitos lugares, os papistas se gabam de ter um pouco do leite da Virgem Maria e do feno em que Cristo jazia no berço. Um franciscano gabou-se de ter um pouco desse feno em uma carteira que carregava consigo. Um malandro pegou o feno e colocou um pouco de carvão no lugar. Quando o monge veio mostrar ao povo seu feno, encontrou apenas a madeira. No entanto, ele não perdeu a cabeça: “Meus irmãos”, disse ele, “eu trouxe a carteira errada comigo, então não posso mostrar-lhes o feno; mas aqui está um pouco de madeira na qual São Lourenço foi grelhado”.

CCCCXXXIII.
Reis e príncipes cunham dinheiro apenas com metais, mas o papa cunha dinheiro com tudo – indulgências, cerimônias, dispensas, perdões, etc.; são todos tipos de peixes que aparecem na sua rede. Só o batismo que escapa, pois as crianças vêm ao mundo sem roupas para serem roubadas ou dentes para serem arrancados.

CCCCXXXIV.
Um monge de um convento próximo em visita a um cavalheiro à beira da morte perguntou: O senhor vai fornecer seu filho para o nosso mosteiro? O cavalheiro moribundo, incapaz de falar, respondeu com um aceno na cabeça. Então o monge foi até filho do cavalheiro e disse: Veja, seu pai nos deixa este legado. O filho então foi até o pai: Senhor, é do seu agrado que eu chute este monge escada abaixo? O cavalheiro moribundo acenou como antes e o filho imediatamente expulsou o monge dali.

CCCCXXXV.
Em falta.

CCCCXXXVI.
Um professor de Wittenberg chamado Vitus Ammerbach propõe que um chefe ou outro é necessário para a igreja, e o papa pode ser muito bem um desses dois chefes. Então Lutero disse: A Grécia nunca esteve sob a autoridade papal, nem a Judéia, nem a Citia, mas em todos esses países haviam cristãos fervorosos. É uma grande presunção propor essas falácias de Ammerbach.

CCCCXXXVII.
Alguém observou: Os papistas se gabam dizendo que nossas doutrinas não durarão por muito tempo, mas não vai dar em nada visto que as doutrinas de Ario, dizem eles, duraram apenas quarenta anos. Dr. Luther respondeu: A seita de Ario manteve-se por quase sessenta anos; mas como foi baseado em princípios heréticos acabou em confusão e decadência, enquanto que os nossos oponentes são compelidos a admitir que temos o direito do nosso lado. Nossa luz brilha tanto aos olhos de todos os homens que ninguém pode negá-la.

CCCCXXXVIII.
Certa vez mostraram aqui em Wittenberg as ceroulas de São José e as calças de São Francisco. O bispo de Mayence se gabava com um vislumbre da chama do arbusto de Moisés. Em Compostela exibem o estandarte da vitória que Jesus Cristo obteve sobre a morte e o demônio. A coroa de espinhos é mostrada em vários lugares.

CCCCXXXIX.
Quando Wolsey, filho de um açougueiro, foi nomeado cardeal, um sujeito bem humorado disse: “Queira Deus que ele venha a ser papa, pois assim teremos carne nos dias de jejum. São Pedro, por ser pescador, tinha proibido a carne para aumentar o preço dos peixes; o filho desse açougueiro fará o mesmo com os peixes.”

CCCCXL.
O cuco tem o costume de parasitar o ninho do pintarroxo. Quando os cucos jovens crescem, eles devoram o pintarroxo. O cuco também tem uma grande antipatia pelo rouxinol. O papa é como o cuco, ele rouba os verdadeiros ovos da igreja e os substitui por seus cardeais gananciosos que devoram a mãe que os alimentou. O papa também não suporta aquele rouxinol que é a pregação e o canto da verdadeira doutrina.

CCCCXLI.
Eles mostram em Roma a cabeça de São João Batista, embora todos saibam que os sarracenos abriram a sua tumba e queimaram seus restos mortais até as cinzas. Essas imposturas dos papistas não podem ser apreendidas com muita seriedade.

CCCCXLII.
A grande maioria dos papistas são meros cabeças-duras. Eu conheci um de seus sacerdotes que foi batizado com as seguintes palavras: Ego te baptiste in nomine Christe. Outro na cantoria costumava dizer elema ao invés de clama e, quando era corrigido, ele apenas berrava a mesma palavra, elema. Outro dizia elicere ao invés de dicere. Em Bamberg, eles exibiam uma vez por ano um livro que falava sobre o imperador Henrique e sua esposa Cunegundes com seus votos de virgindade no dia do casamento. Birkheimer, quando passou em Bamberg, pediu para dar uma olhada nesse livro e logo constatou que era apenas uma cópia dos Tópicos de Cícero. Em um convento, os irmãos liam musimus ao invés de sumpsiums. Um jovem irmão, já recém-formado, ao corrigir tal erro recebeu como resposta: “Cuide de sua vida! Nós sempre lemos munsimus e não vamos mudar nossa leitura por você!”

CCCCXLIII.
Dois bobos da corte travaram uma discussão diante do papa que estava jantando, um afirmava e o outro negava a imortalidade da alma. O papa se mostrou a favor da imortalidade da alma e apresentou excelentes razões, mas decidiu estar do lado do bobão que negava a imortalidade porque parecia-lhe uma doutrina conveniente, oferecendo-lhe uma perspectiva muito desejável; e são miseráveis como esse papa que o governo da igreja deve ser confiado.

CCCCXLIV.
Alberto, bispo de Mayence, tinha um médico que cuidava de sua saúde, mas por ser protestante ele não recebia os favores desse prelado. Esse médico com a sua ambição negou a Deus e decidiu voltar para o papismo dizendo aos seus irmãos: Vou deixar Jesus Cristo de lado por algum tempo para que eu possa receber minha fortuna, então irei buscá-lo novamente. Essa horrível blasfêmia encontrou sua justa recompensa; pois no dia seguinte o médico hipócrita foi encontrado morto em sua cama, com a língua pendurada para fora da boca, o rosto negro como carvão e o pescoço meio torcido. Eu mesmo fui testemunha ocular desse merecido castigo da impiedade.

CCCCXLV.
Philip Melancthon tinha mencionado que todos os dias, quando o papa Clemente VII jantava ou ceava, seu copeiro e cozinheiros eram mantidos presos por duas horas, e então caso nenhum sintoma de veneno se manifestasse em seu mestre, eram liberados. “Que vida miserável”, observou Lutero, “É exatamente o que Moisés descreveu em Deuteronômio: ‘E tua vida estará em dúvida diante de ti, e tu temerás dia e noite, e não terás certeza de tua vida. Pela manhã dirás que Deus fosse justo! E a tarde dirás quem dera fosse de manhã!'”

CCCCXLVI.
A humilde Virgem Maria de Nazaré acerta em cheio esses potentados e papas quando ela mesma canta: “Vou derrubar os poderosos de seus assentos.” Sem dúvida ela tinha uma voz doce e pomposa.

O papa e toda sua horda são meros idólatras e servos do diabo, com todas as suas ações e vida; pois ele não reconhece a Palavra de Deus, muito pelo contrário, ele a persegue e a condena, e direciona todo o seu malabarismo para nos afastar da verdadeira fé em Cristo. Ele finge grande santidade sob uma aparência do serviço divino com capuzes, aparas, jejuns com peixes, rezar a missa e coisas do tipo; mas lá no fundo é pura doutrina do diabo; e a causa pela qual o papa mantém tão rigidamente tal doutrina diabólica é aquela que o Evangelho relata, Matt, IV. O diabo mostrou a ele os reinos desse mundo, e fez promessas a ele como fez a Cristo. Isso faz com que ele condene nossos sermões, pelos quais somos mendigos e suportamos muito, enquanto que através de sua doutrina ele obtém dinheiro, riqueza, honra e poder, e é um monarca tão poderoso que pode trazer imperadores para o seu cercado.

CCCCXLVII.
Não consigo imaginar numa possibilidade de paz entre nós e os papistas, visto que nenhum cederá ao outro; é uma guerra eterna semelhante a semente da mulher contra a velha serpente. Quando os reis estão cansados de guerrear, eles dão uma trégua, as vezes bem duradoura, mas no nosso caso não pode haver tais cessações; pois não podemos nos afastar do Evangelho, nem eles desistirão de suas idolatrias e blasfêmias; o diabo não permitirá que seus pés sejam cortados e muito menos Cristo impedirá a pregação de Sua Palavra; portanto, eu não consigo enxergar paz ou trégua entre Cristo e Belial.

CCCCXLVIII.
Depois que cessaram a perseguição à igreja, os papas visaram o governo por ambição. O primeiro foi Hildebrand, ou melhor, Hellbrand; ele assustou o povo com a sua excomunhão que era algo tão terrível que nem mesmo as crianças escaparam. Por outro lado, o papa buscou a boa vontade do povo através da venda da remissão dos pecados que nunca foram tão pesados. Se alguém sequestrasse a Virgem Maria ou novamente crucificasse a Cristo, o papa concederia o perdão por dinheiro. E foi através da minha caneta que Deus trouxe confusão nesse domínio papal; pois Deus, do nada, é capaz de fazer todas as coisas e, através de mínimos detalhes, é capaz de produzir os maiores resultados.

CCCCXLIX.
O papado deve ser levado à fogueira e pagar por todos. O papa será devorado pelas suas próprias criaturas, os frades. O cardeal Campeggio tinha dito que a grande e inumerável multidão de monges e frades produz grandes males; pois eles abalam aquela bela monarquia do papado que é tão cuidadosamente erguida; e ele não está errado; a casa do Rei Rato está sendo pago pelos seus ratos. Pela divindade ele não pode ser defendido, pois não é um argumento de seus anonistas e de sua horda mediante a um governo de muitas regras como de costume. Como o papa é capaz de julgar visto que não possui habilidade ou experiência em questões de governo temporal? Suas decisões são tão tolas nas causas matrimoniais. Ele proibiu sua comitiva ungida de entrar no estado de matrimônio, embora ordene que seja celebrado como um sacramento. Se o matrimônio é um sacramento, não pode ser para os pagãos; pois os gentios incrédulos nada tem a ver com eles.

CCCCL.
É uma mera fábula dizer que o imperador Constantino deu ao papa propriedades e pessoas para se vangloriar. Eu li que Constantino tinha dado muitas esmolas aos pobres ordenando bispos que as distribuíssem, por meio do qual eles se tornaram grandes senhores. Mas Constantino não forneceu países, nem cidades; portanto, o mundo se pergunta de onde os papas derivaram tais domínios. Antigamente, os papas não eram senhores de imperadores e reis, mas eram instituídos ou ordenados por eles.

CCCCLI.
O mundo continua sendo o que era há milhares de anos; isto é, a esposa do diabo. O mundo diz agora como os fariseus disseram a seus seguidores, a quem eles enviaram para prender a Cristo: “Vocês também foram enganados? Algum dos governantes ou fariseus acreditou nele? Este povo que não conhece a lei é amaldiçoado.” Da mesma maneira o mundo diz agora: Os grandes e bispos acreditam na doutrina luterana?

CCCCLII.
O papa não nega o sacramento, mas roubou dos leigos uma parte dele; nem mesmo ensina o verdadeiro uso do sacramento. O papa não rejeita a Bíblia, mas persegue e mata mestres justos e piedosos, como os judeus que perseguiram e mataram os profetas que verdadeiramente expuseram e ensinaram as Escrituras. O papa permite a permanência da substância e a essência do sacramento, e da Bíblia Sagrada; mas ele nos força a usá-los de acordo com a sua vontade e prazer, nos forçando a acreditar na transubstanciação fictícia e na presença real, isto é, fisicamente. O papa nada mais faz do que perverter e abusar de tudo o que Deus ordenou.

CCCCLIII.
A principal razão pela qual me desentendi com o papa foi esta: o papa se gaba por ser o chefe da igreja condenando tudo aquilo que não estiver sob seu poder e autoridade; pois ele mesmo tinha dito que embora Cristo seja o Cabeça da igreja, ainda assim é necessário um cabeça corporal da igreja na terra. Com isso eu poderia estar em pleno acordo se ele estivesse ensinando o Evangelho puro e verdadeiro, e não introduzido invenções e mentiras em seu lugar. Além disso, ele tomou sobre si o poder, o domínio e a autoridade sobre a igreja cristã e sobre as Sagradas Escrituras, a Palavra de Deus; nenhum homem tem permissão de expor as Escrituras, apenas o papa de acordo com seus conceitos ridículos; de modo que ele se fez senhor da igreja, proclamando-a ao mesmo tempo mãe poderosa e imperatriz das Escrituras, às quais devemos ceder e sermos obedientes; isso não era para ser tolerado. Aqueles que se gabam da autoridade da igreja além de serem meros idiotas também estão sendo contra a Palavra de Deus. O papa atribui mais poder à igreja que foi gerada do que ao Verbo, que gerou a igreja.

Nós, pela graça de Deus, não somos hereges, mas cismáticos. Realmente causamos divisão, mas nós não somos culpados e sim os nossos adversários que deram essa ocasião por não permanecerem apenas na Palavra de Deus, Palavra essa que temos que ouvir e seguir.

CCCCLIV.
Quando nosso Deus pretende punir alguém, Ele o deixa na cegueira de um modo que não reconheça a Palavra de Deus, mas o condena, como os papistas agora fazem. Eles sabem que a nossa doutrina é a Palavra de Deus, mas não aceitam esse silogismo e conclusão: Quando Deus fala, devemos ouvi-lo; Deus fala através da doutrina do Evangelho, portanto devemos ouvi-lo. Mas os papistas, contra suas próprias consciências, dizem: Não! Devemos ouvir a igreja!

É muito estranho eles admitirem ambas as proposições; mas não aceitam as consequências, ou aceitam que as conclusões estejam corretas. Eles insistem com alguns decretos do Concílio de Constança e dizem que apesar que Cristo fale é a mais pura verdade, um antigo costume deve ser aceito e observado como lei. E é assim que eles respondem quando procuram torcer e perverter a verdade.

Se este pecado do anticristo não for um pecado contra o Espírito Santo, então não sei definir e distinguir os pecados. Eles pecam aqui voluntariamente contra a verdade revelada da Palavra de Deus de uma maneira mais teimosa e obstinada. Eu deveria rezar por aqueles que não resistem a esses lábios mentirosos, diabólicos e desavergonhados? Não me admiro que John Huss tenha morrido com tanta alegria ao saber das maldades dos papistas. Eu oro, como o papa se posiciona em relação à igreja? Ele a preserva apenas com um brilho aparente, pomposo e sucessor. Mas nós a julgamos de acordo com a sua essência, em sua própria substância, isto é, de acordo com a Palavra de Deus e os sacramentos. O papa está reservado para o julgamento de Deus, então será somente no julgamento de Deus que ele será destruído. Henrique VIII, rei da Inglaterra, agora é inimigo do papa, mas não de sua essência e substância; mesmo se matasse o papa, o rei continuaria com a sua falsa doutrina; o papa pode muito bem tolerar tal inimigo; visto que ele tem a esperança de que num espaço de vinte anos irá recuperar o seu domínio novamente. Mas a minha luta é sobre a alma do papa, sua doutrina com a Palavra de Deus, e não seu corpo, isto é, sua pessoa e vida perversas. Eu não apenas arranco suas penas, como o rei da Inglaterra e o príncipe George da Saxônia fizeram, mas coloco a faca em sua garganta cortando sua traqueia em pedaços. Colocamos o ganso no espeto, mas se colhêssemos as penas, elas cresceriam novamente. Portanto, Satanás é o nosso inimigo ferrenho porque cortamos a garganta do papa, como também faz o rei da Dinamarca que visa a essência do papado.

CCCCLV.
É maravilhoso ver como a majestade do papa caiu de uns tempos pra cá. Até então todos os monarcas, imperadores, reis e príncipes temiam o poder papal que os mantinha sob seu comando; ninguém ousava sequer murmurar uma palavra contra ele. Este grande deus caiu junto com suas próprias criaturas, os frades e os monges, que agora tornaram seus inimigos; aqueles que ainda continuam com ele é mais por uma questão de benefícios; caso contrário, eles se oporiam a ele mais ferozmente do que nós.

CCCCLVI.
A coroa do papa é chamada de regnun mundi, ou seja, o reino do mundo. Ouvi dizer em fontes confiáveis que essa coroa vale mais que todos os principados da Alemanha lá em Roma. Deus colocou o papado na Itália por algum motivo, pois os italianos são capazes de fazerem coisas reais e verdadeiras de uma maneira não confiável; eles têm cérebros astutos e sutis.

CCCCLVII.
Se o papa fosse o cabeça da igreja cristã, então a igreja seria um monstro com duas cabeças, visto que São Paulo ensinou que Cristo é o cabeça dela. O papa pode muito bem ser o cabeça de uma falsa igreja.

CCCCLVIII.
Aonde está o pintarroxo, também há o cuco, pois ele acha que sua canção é mil vezes melhor do que a do pintarroxo. Da mesma maneira, o papa se coloca na igreja e para que seu canto seja ouvido, sobrecarrega a igreja. O cuco é bom para alguma coisa, pois sua presença significa que o verão está próximo; então a presença do papa significa que juízo final se aproxima.

CCCCLIX.
Há muitas pessoas que me consideram muito cruel contra o papado; ai de mim! Pelo contrário! Minhas reclamações são muito leves. Mas eu gostaria que cada palavra minha fosse um raio lançado contra o papado.

CCCCLX.
É uma ideia ociosa que os papistas tem em relação ao anticristo; eles supõem que o anticristo é uma pessoa que irá governar, roubando toda riqueza deles, fazendo milagres e carregando um forno ardente para matar os santos.

CCCCLXI.
O papado forma padres não para pregar e ensinar a Palavra de Deus, mas apenas para celebrar missa e perambular com o sacramento. Pois quando um bispo ordena um homem, ele diz: Tome para ti o poder de celebrar a missa oferecendo para os vivos e para os mortos. Mas nós ordenamos sacerdotes de acordo com o mandamento de Cristo e de São Paulo, ou seja, para pregar o evangelho puro e a Palavra de Deus. Os papistas não fazem menção de pregar e ensinar a Palavra de Deus em suas ordenações; portanto sua consagração e ordenação são falsas e injustas, pois toda adoração que não é ordenada por Deus, ou erigida ela Palavra e mandamento de Deus, não vale nada; é tudo mera idolatria.

CCCCLXII.
Ao lado da minha justa causa, a minha pequena reputação e o meu aspecto mesquinho de ser deram o golpe no papa. Pois quando comecei a pregar e a escrever, o papa me desprezou e me condenou dizendo: É apenas um pobre frade; o que ele pode fazer contra mim? Eu mantive e defendi essa doutrina papal contra muitos imperadores, reis e príncipes, o que então este homem deve fazer? Se ele tivesse condescendido em me considerar, poderia ter facilmente me reprimido logo no começo.

CCCCLXIII.
Um alemão, fazendo sua confissão a um padre em Roma, jurou manter segredo tudo o que o padre lhe dissera até chegar em casa; então o padre deu a ele a perna de um jumentinho que foi montado por Cristo quando entrou em Jerusalém. A perna estava muito bem embalada em uma seda, e o padre disse em seguida: Esta é a relíquia sagrada na qual o Senhor Cristo se sentou corporalmente, e a perna desse jumentinho foi tocada pela perna sagrada de Cristo. Então o alemão ficou maravilhado e levou consigo a dita relíquia sagrada para a Alemanha. Chegando nas fronteiras, ele se gabou de sua relíquia sagrada na presença de outros quatro camaradas seus; quando, de repente, descobriu-se que cada um deles também recebeu do mesmo padre uma perna depois de jurar o mesmo segredo. Então todos exclamaram com grande admiração dizendo: Senhor!! Esse jumentinho tinha cinco pernas?

CCCCLXIV.
Lutero recebeu uma pintura que mostra o papa com Judas, o traidor, representados em uma carteira e nas chaves. Ele disse: Vai irritar muito o papa; que ele, a quem os imperadores e reis o adoram, agora seja visto em suas fechaduras falsas. Também entristecerá os papistas, pois suas consciências serão tocadas. A carteira combina perfeitamente com os chapéus do cardeal e suas rendas, pois a cobiça do papa tem sido tão grosseira que em todos os reinos ele não só arrecadou para si mesmo Annates, Palliummoney, etc., mas também vendeu por dinheiro os santos sacramentos, indulgências, fraternidades, sangue de Cristo, matrimônio, etc. Portanto, sua carteira está cheia de roubos sobre os quais justamente deveriam ser exclamados, como no Apocalipse: Recompense-os como eles fizeram a você, e faça-lhes o dobro, de acordo com suas obras. Portanto, visto que o papa me condenou e me entregou ao diabo, então, em retribuição, vou enforcá-lo em suas próprias chaves.

CCCCLXV.
É abominável que em tantos decretos do papa não haja uma única frase da Sagrada Escritura, ou um artigo do Catecismo mencionado. O papa pretende conduzir o governo de sua igreja de forma aparente com seus ensinos blasfemos; como aquele capuz de frade fedorento colocado sobre um cadáver para obter a remissão dos pecados sendo de igual valor com os méritos do nosso abençoado Salvador Cristo Jesus.

CCCCLXVI.
Não é de admirar que os papistas me odeiem com unhas e dentes, pois bem mereci isso de suas mãos. Cristo reprovou mais suavemente os judeus do que eu os papistas, mas eles o mataram. Estes pensam que me perseguem com justiça e de acordo com as leis e a vontade de Deus, mas logo eles descobrirão seus erros. No dia do juízo final denunciarei o papa e seus tiranos que desprezam e atacam a Palavra de Deus e seus sacramentos. O papa destrói os padres pobres e casados, enquanto por todas as suas leis eles devem apenas ser destituídos de seus ofícios. Assim, o príncipe George baniu e expulsou de Oschitz dez cidadãos e pais de família com vinte e sete filhos, mártires da Palavra. Seus suspiros subirão ao céu contra ele.

CCCCLXVII.
Não é possível para o papa e sua equipe tolerarem a ideia de reforma; essa palavra tão simples cria mais alarme em Roma do que raios celestiais ou da aproximação do Juízo Final. Um cardeal tinha dito dias atrás: Que comam, bebam e façam o que quiserem; mas quanto a nos reformar é uma ideia vã; nós não vamos tolerar isso. Nem nós, protestantes, ficaremos satisfeitos, embora eles administrem o sacramento em ambos os tipos e permitam que os padres se casem; também temos a doutrina da fé pura e verdadeira, e a justiça salvífica diante de Deus que expulsa toda a idolatria e a falsa adoração; esses feitos e banidos, a fundação sobre a qual a cúpula do papa é construída também cai.

CCCCLXVIII.
Teremos o santo sacramento administrado em ambos os tipos, que será livre para os padres se casarem ou se absterem, e de modo algum deixaremos nos privar do artigo da justificação: “Que somente pela fé em Jesus Cristo somos justificados e salvos diante de Deus; sem quaisquer obras, méritos e deserções, meramente pela graça e misericórdia.” Devemos manter esse artigo que é puro e verdadeiro para a salvação. Quanto à missa privada não podemos impedi-la, mas devemos deixá-la para Deus para ser acionada por aqueles sobre os quais não alcançamos; mesmo assim vamos ensinar e pregar abertamente contra isso, e provar que é uma blasfêmia abominável e idolatria. Ou devemos ir juntos para escutar, e eles devem ceder a nós neste particular em nossos países; se caso acontecer de eles cederem a nós, então ficaremos contentes; pois assim como os cristãos lideram com os arianos, e também como São Paulo foi forçado a se comportar em relação aos judeus, também devemos assim deixar os papistas com suas próprias consciências já que eles não nos aceitarão, também não podemos força-los; estão entregues ao julgamento de Deus; manteremos firmes na doutrina verdadeira e quem quiser se irritar, deixe-o se irritar.

CCCCLXIX.
Os papistas enxergam uma causa ruim e, portanto, trabalham para mantê-la com argumentos muito fracos, que não conseguem manter a prova sendo facilmente refutados.

Eles dizem: “O louvor de qualquer coisa é uma invocação; devemos louvar os santos para serem invocados”. Eu respondo: Não, de forma alguma; nenhum louvor é para invocar; as pessoas casadas são louvadas, mas não invocadas; a invocação pertence comente a Deus, e não a criatura que esteja no céu ou na terra e nem a qualquer anjo.

Eles dizem: “A doutrina da remissão dos pecados é necessária; indulgências, perdões e graças são remissões de pecados; portanto, são necessárias.” Não: os perdões do papa não são remissões de pecados, mas satisfações pela remissão das penas; meras fábulas e ficções.

CCCCLXX.
Quando eu estava em um debate público em Roma, estavam ali também presentes trinta doutores eruditos contra o poder do papa. Ele estava se gabando dizendo que com sua mão direita comandava os anjos do céu, e com a sua mão esquerda tirava as almas do purgatório e que a sua própria pessoa estava mesclada com a divindade. Calixto contestou tais afirmações dizendo que era apenas na terra que o poder era dado ao papa, para ligar e desligar. Os outros doutores então o atacaram com extrema veemência, e Calixto novamente os interrompeu dizendo que havia falado apenas por causa do debate e que suas opiniões eram apenas opostas.

CCCCLXXI.
Pelo espaço aproximado de cem anos, não houve um único bispo que tenha mostrado qualquer interesse em assuntos relacionados a escolas, batismo e pregação; teria sido um grande problema para eles, visto que são inimigos de Deus. Tenho escutado diversos doutores afirmarem que a igreja há muito tempo precisava de uma reforma; mas nenhum homem teve a ousadia de atacar o papado; pois o papa carregava em seu estandarte o Noli me tangere; então todo homem ficava em silêncio. O Dr. Staupitz me disse uma vez que se caso você se intrometer com o papado, o mundo inteiro ficaria contra você; e ainda acrescentou que, no entanto, a igreja é construída sobre sangue, e com sangue deve ser aspergida.

CCCCLXXII.
Eu gostaria que todos aqueles que pretendem pregar o Evangelho dessem uma olhada nos decretos e nos livros abomináveis desses papistas; e, acima de tudo, observem cuidadosamente os horrores da missa – devido a idolatria, Deus poderia justamente ter afogado e destruído o mundo inteiro – até o fim, e suas consciências precisam estar armadas e confirmadas contra os seus adversários.

CCCCLXXIII.
Aquele livro do monge italiano, As Conformidades, onde é feita uma comparação entre Cristo e São Francisco, é um tecido de mentiras tão cabulosas que aquele que o escreveu deve ter sido possuído por um demônio não apenas espiritualmente, mas também corporalmente. Aquele monge afirma que Cristo é uma figura ou um símbolo de São Francisco, e também afirma que Cristo deu a São Francisco o poder de salvar ou condenar a quem ele quisesse.

CCCCLXXIV.
Em um mosteiro em Luneburg, existe até hoje um grande altar que apresenta a vida e os milagres de Cristo; seu nascimento, a entrada em Jerusalém, sua paixão e morte, a descida ao inferno, sua ressurreição e ascensão. Da mesma forma é apresentado São Francisco, seu nascimento e milagres, sua morte e ascensão aos céus, além de estimarem as obras de São Francisco de igual valor com as obras de nosso bendito Salvador Cristo Jesus; uma grande e abominável blasfêmia.

CCCCLXXV.
Os decretos do papa são inúteis; aqueles que os desenhou era um burro. Eles são um livro montado com um casaco de mendigo e remendado com outros tipos de trapos. Não há nada neles sobre a igreja; apenas visam questões temporais. No entanto, o papa diz que esses decretos devem ter igual autoridade com o Evangelho e com os escritos dos apóstolos.

CCCCLXXVI.
Nos decretos do papa existem muitos cânones horríveis e diabólicos; são uma grande praga para a igreja. O papa, sem vergonha, ainda se atreve a dizer: “Quem não acredita e não observa meus decretos, será em vão para ele acreditar em Cristo ou dar créditos aos quatro evangelistas.” Não é esta a linguagem do próprio diabo derramando veneno mortal na Igreja? Novamente, ele diz em um de seus decretos que, embora condene as pessoas ao inferno, mesmo assim é necessário segui-lo; contrariando o ofício do verdadeiro bispo que é confortar os quebrantados e tristes de coração e conduzi-los a Cristo. Pois sobre este vilão patife!! Ele deve ensinar as consciências desesperando-as dessa maneira? Quem lê os decretos encontrará sentenças justas da Escritura monstruosamente alteradas para confirmação; e, em outros casos, quando a Escritura está claramente contra eles, é dito na cara de pau que a Igreja Romana decidiu de outra forma. Assim sendo, como um cão infernal, o papa ousa submeter a Palavra de Deus às criaturas humanas. É o mesmo com Tomás de Aquino que argumenta em seus livros pro et contra, quando é citado uma passagem da Escritura, ele prossegue: Aristóteles sustenta o contrário; de modo que a Sagrada Escritura deve dar lugar a Aristóteles, um pagão. O mundo não dá ouvidos a essa escuridão abominável, mas condena a verdade e cai em erros absurdos. Portanto, façamos o bom uso do nosso tempo, pois nem sempre as coisas serão como agora.

CCCCLXXVII.
Nos decretais, o papa domina e é vencedor; lá está ele em seu monturo, possuído e trovejando com essas palavras: “Temos conhecimento e autoridade e, por ordem divina, julgamos; todos os outros devem ser obedientes a nós.” Nenhuma criatura humana pode criticar o papa; somente ele, ele sozinho, tem poder para julgar e criticar todo o mundo desse universo. Estou convencido que nas leis espirituais do papa está escrito mais de mil vezes que as ações do papa não podem ser criticadas por nenhum homem.

CCCCLXXVIII.
A lei espiritual do papa é um livro imundo, fedendo a dinheiro. Se tirar a sua ambição nada resta de sua própria substância, mas há um grande brilho, pois toda a infelicidade deve começar in nomine Domini. Assim como toda retidão e saúde salvadora são apenas “em nome do Senhor, pois toda a idolatria e superstição não estão ocultos aos olhos de Deus. Portanto, o mandamento diz apropriadamente: Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão.”

CCCCLXXIX.
Graciano, o advogado que reuniu os decretos, esforçou-se com diligência para organizá-los de uma forma congruente separando o que é bom e o que é mau. O bom homem tinha boas intenções, mas o resultado foi inútil; pois ele procedeu rejeitando o que era bom para justificar o que era mau, e assim empreendeu o impossível, ficando maravilhado e amedrontado.

CCCCLXXX.
O jejum dos frades é mais simples do que a nossa própria alimentação. Para um dia de jejum há três festas. Para cada frade são dois litros de cerveja, um litro de vinho e bolos de especiarias, ou um pão com sal para melhor saborear sua bebida. E assim continuam esses pobres irmãos em jejum; ficando tão pálidos e abatidos como anjos de fogo.

CCCCLXXXI.
Se o imperador merecesse elogios imortais, ele erradicaria completamente a ordem dos capuchinhos, e para uma lembrança eterna de suas abominações, faria com que seus livros permanecessem sob custódia. Esta é a pior e mais venenosa seita. Os frades agostinianos e bernardinos não são comparáveis e esses malditos piolhos.

CCCCLXXXII.
Francisco era um italiano nascido na cidade de Assis, sem dúvida era um homem justo e honesto. Ele jamais imaginava que tais superstições e descrenças sairiam de sua vida. Houveram tantos desses frades cinzentos que se ofereceram, um total de quarenta mil, para irem guerrear contra os turcos, e ainda assim deixaram seus mosteiros suficientemente providos.

Os frades franciscanos e cinzentos surgiram sob o imperador Frederico II, foi também na época em que Santa Isabel tinha sido canonizada no ano de 1207. Francis montou sua jogada durante dezoito anos; dois anos sob o imperador Filip, quatro anos sob o imperador Otão e doze anos sob o imperador Frederico II. Eles inventaram que após a sua morte, Francis apareceu para o papa em uma visão enchendo um cálice que estava em sua mão com sangue e que escorria ao seu lado. Pensem bem, não foi esse um pedaço do governo que começou com sonhos e mentiras? O papa não é a imagem de Deus, e sim o seu imitador. Ele será Deus e Imperador; como dizia o papa Inocêncio III: Ou eu tomarei a coroa do imperador Filipe, ou ele tirará a minha de mim. Oh! Tais histórias devem ser escritas cuidadosamente para que as gerações futuras possam saber as verdadeiras bases onde o papado foi fundado e erguido; ou seja sobre meras mentiras e fábulas. Se eu fosse mais jovem, escreveria uma crônica dos papas.

CCCCLXXXIII.
Se o papa procurasse suprimir os frades mendicantes, ele encontraria um bom passatempo; ele os engordou e os acariciou em seu coração, e designou-lhes os mais poderosos príncipes como protetores. Se ele tentasse aboli-los, todos eles se uniriam e instigariam os príncipes contra ele, pois muitos reis e príncipes além do próprio imperador possuem frades como confessores. Os frades eram como as colunas do papa, eles o carregavam como o rato carrega o seu rei; Eu era o mercúrio que Deus jogou no tanque desses peixes; isto é, que ele lançou entre os frades.

Um frade é mau em todos os sentidos, seja no mosteiro ou fora dele. É como o exemplo que Aristóteles deu sobre o incêndio na Etiópia ou na Alemanha, o conceito é o mesmo com os frades. A natureza não é alterada por quaisquer circunstância de tempo ou lugar.

CCCCLXXXIV.
Na Itália havia uma ordem particular de frades chamados de Fratres Inorantiae, isto é, Irmãos da Ignorância, onde fizeram um juramento solene sem nenhum conhecimento, mas responderiam todas as perguntas com Néscio. Verdadeiramente, todos os frades são bem dignos desse título, pois eles apenas leem e balbuciam as palavras, mas não reconhecem seus significados. O papa e os cardeais pensam que se esses irmãos fossem instruídos, eles nos dominariam. Portanto, saccum per neccum, ou seja, pendurar uma sacola em seus pescoços e enviá-los a mendigar pelas cidades, vilas e países.

CCCCLXXXV.
Uma matrona honesta aqui em Wittenberg, viúva do cônsul Horndorff, queixou-se da cobiça dos capuchinhos, pois um deles pressionou seu pai no leito de morte a deixar algo para o seu mosteiro, então arranco-lhe quatrocentos florins; o frade também a obrigou a fazer um voto de que não mencionaria tal assunto para ninguém. O homem tinha guardado aquele dinheiro para prestar caridade as crianças prejudicadas e órfãos daquela cidade. Por fim, por ordem do magistrado, ela denunciou a ação do frade. No entanto, ocorreram muitas ações desse tipo, mas ninguém ousou reclamar. Eram infinitos roubos praticados por esses insaciáveis e miseráveis doentes por dinheiro.

CCCCLXXXVI.
Quando eu estava no mosteiro em Erfurt, haviam dois frades pregadores, ambos descalços, vagando juntos pelo campo para pedir esmolas para os irmãos. Esses dois se divertiam um com o outro em seus sermões. O frade descalço pregava da seguinte maneira: “Amados habitantes do campo e bons amigos! Cuidado com aquele pássaro, a andorinha, pois é branco por dentro, mas é preto nas costas; é um pássaro maligno que está sempre cantando, mas sua cantoria não possui nenhum valor; e quando se irrita, fica completamente louco”, provavelmente estava se autodescrevendo, pois esses frades vestiam túnicas pretas por fora e linho branco por dentro. Em seguida, durante a tarde, o outro frade pregador subiu ao púlpito e brincou: “De fato, meus amigos amorosos, eu não posso defender a andorinha; mas o pardal cinza é um pássaro muito pior e mais prejudicial que a andorinha; pois além de picar as vacas, ele também atinge os olhos das pessoas, deixando-as cegas como vocês podem ver no livro de Tobit. Ele rouba tudo o que consegue como aveia, cevada, trigo, centeio, maçãs, peras, ervilhas, cerejas, etc. Além disso, ele é um pássaro lascivo: e sua maior arte é gritar – scrip, scrip”, etc. E assim são os frades de pés descalços com uma aparência de santidade e humildade, mas tão orgulhosos do que os reis ou príncipes e, acima de tudo, vivem na imaginação inventando mentiras e mais mentiras.

CCCCLXXXVII.
São Bernardo foi o melhor monge que já existiu, a quem eu amo mais que todos os monges; no entanto, ele ousou a dizer que era um sinal de condenação se caso um homem abandonasse o mosteiro. Ele tinha sob seu comando três mil monges e nenhum deles foi condenado. São Bernardo viveu em tempos perigosos, sob os imperadores Henrique IV e V, Conrad e Lothaire. Ele era um monge erudito e ágil, mas que infelizmente não deu um bom exemplo. Os frades, principalmente os franciscanos, tiveram dias fáceis devido a sua hipocrisia; eles não tocavam em dinheiro, mas tinham uma vida luxuosa. A vida dos frades maus começara cedo quando passaram a abandonar os assuntos temporais sob pretexto de piedade. A vocação e condição de um verdadeiro cristão, conforme Deus ordenou, consiste em três hierarquias – Doméstica, Temporal e Governo da Igreja.

CCCCLXXXVIII.
O estado de celibato é uma grande hipocrisia e maldade. Agostinho, embora tenha vivido em um tempo agradável, foi enganado através da exaltação das freiras. Embora foi permitido o casamento, ele disse que elas erraram ao se casarem e pecaram contra Deus. Então quando chegou o tempo da cólera e da cegueira, a verdade passou a ser caçada e a mentira prevaleceu; a geração de mulheres pobres foi condenada sob a aparência de uma santidade, mas que na verdade era mera hipocrisia. Cristo, com uma simples frase, refuta todos esses argumentos: Deus os criou homem e mulher.

CCCCLXXXIX.
A cobiça do papa excedeu todas as outras, e o diabo escolheu Roma como sua habitação peculiar. Os antigos diziam que Roma é um antro de cobiça, uma raiz de toda maldade. Eu li um verso de um livro muito antigo que dizia o seguinte:

“Verus Amor, mundi capu est, et bestia terrae.”

Podemos ver que quando a palavra Amor é virada e lida ao contrário aparece Roma, ou seja, Roma é a cabeça do mundo, uma besta que devora todas as terras. Tudo é entregue nas mãos de Roma sem nenhuma pregação ou qualquer serviço religioso, apenas por superstição, idolatria e venda de suas boas obras aos pobres leigos ignorantes por dinheiro. São Pedro descreve tal cobiça com palavras claras quando diz: “Eles têm um coração exercitado com práticas gananciosas.” Estou convencido que um homem não vai conseguir conhecer a doença da cobiça sem antes de conhecer Roma; pois todos os enganos e malabarismos do mundo em nada se compara com os de Roma.

CCCCXC.
O provérbio diz: Vidas de padres são vidas cativantes; os bens dos sacerdotes nunca prosperam; e sabemos que isso é verdade pela experiência, pois aqueles que investiram na vida espiritual ficaram pobres e tornaram-se mendigos.

CCCCXCI.
Santo Agostinho entre outros santos diferenciam hereges dos cismáticos, e maus cristãos; Um cismático é aquele que levanta divisões professando a verdadeira fé da igreja cristã, mas não possui comunhão com a igreja em relação a certas cerimônias e costumes; Um mau cristão é aquele que concorda com a igreja tanto na doutrina da fé quanto nas cerimônias, mas fora da igreja leva uma vida perversa e em pecado. Mas um herege é aquele que introduz falsas opiniões e doutrinas contra os artigos da fé cristã, contrários à Sagrada Escritura, e obstinadamente os mantém e os defende. Os papistas não me chamam de herege, mas de cismático; aquele que prepara discórdias e contendas. Mas eu digo que o papa é um arqui-herege, pois ele é um adversário do meu abençoado Salvador Cristo; e eu também sou para o papa, porque ele faz novas leis e ordenanças tendo como base a sua própria vontade, e assim nega constantemente o sacerdócio eterno de Cristo.

Marquemos apenas dois pontos em seus decretos onde ele se exalta majestosamente acima das Sagradas Escrituras. Ele se contenta em atribuir esses decretos para os padres, mas a decisão de sua verdade ele reserva para a cátedra de Roma. Então ele descarrega seus trovões e relâmpagos contra mim e contra os seus próprios decretos, pois o próprio papa diz: A justiça deve dar lugar à verdade. Para esse propósito, ele apresenta o exemplo do rei Ezequias que quebrou em pedaços a serpente de bronze que Deus havia ordenado que fosse erguida. Mas o papa age de uma maneira totalmente contrária às suas próprias leis e decretos; pois ele verá que a verdade vai expor seus inúmeros erros. E, de fato, é um caso grave que os jovens não tenham conhecimento dos erros do papa; eles acham que o evangelho sempre foi o mesmo que agora. Se tivéssemos mantido a Palavra de Deus com a devida honra e reverência, tais erros abomináveis e idolatrias nunca teriam surgido ou se infiltrado entre nós.

CCCCXCII.
Como os pagãos diziam, é através de uma concordância que as pequenas coisas e a riqueza aumentam; mas a dissensão é perigosa e prejudicial, especialmente nas escolas, profissões, artes eruditas e seus professores, onde um deve estender a mão ao outro, beijando e abraçando. Mas quando mordemos uns aos outros, tenhamos cuidado para não sermos engolidos juntos. Então vamos orar e esforçar porque a palavra da fé e as orações dos justos são as armas mais poderosas; além disso, o próprio Deus envia seus santos anjos ao redor daqueles que o temem. Devemos lutar bravamente, pois estamos sob o comando do Senhor dos exércitos; portanto, com uma mão devemos construir e com a outra mão pegar na espada – isto é, ensinar e resistir.

Agora é hora de vigiar, pois somos o alvo para o qual eles atiram; nossos adversários pretendem fazer uma confederação com os turcos; eles visam a nós, mas devemos arriscar; pois o anticristo guerreará e obterá a vitória contra os santos de Deus. Estamos expostos no maior perigo por causa da deslealdade e traição; os papistas se empenham em corromper nossos capitães e oficiais com dinheiro. Um burro carregado de dinheiro pode fazer qualquer coisa, como Tácito escreveu sobre nós, alemães; eles foram ensinados a receber dinheiro; não há fidelidade e muito menos verdade nessa terra.

CCCCXCIII.
Os papistas possuem um culto aparentemente justo e brilhante; eles se gabam muito da Palavra de Deus, da fé, de Cristo, dos sacramentos, do amor, da esperança, etc., mas eles negam totalmente o poder e a virtude de tudo isso, ensinando tudo ao contrário o que eles expõem. São Paulo diz muito bem: “Eles negam o poder da piedade”. São Paulo não diz que eles negam a piedade, mas sim negam o poder, a força e a virtude dela, por meio de doutrinas falsas e supersticiosas.

CCCCXCIV.
Lutero, vindo de Roma, mostrou ao príncipe eleitor da Saxônia um quadro que trouxera consigo onde foi pintado a figura do papa frustrando o mundo inteiro com suas superstições e idolatrias. Estava desenhado uma barquinha da igreja cheia de frades, monges e padres, lançando linhas da nau para aqueles que estavam no mar; o papa estava sentado atrás, no fundo do navio, com os cardeais e bispos, coberto pelo Espírito Santo, e estava olhando para o céu rezando por aqueles que nadavam no mar em grande perigo de vida, até que foram içados para dentro do navio e salvos.

Essas e outras tolices nós acreditávamos como artigos de fé. Os papistas cegos fingem que passam por muitas tribulações nesse mundo, visto que eles chafurdam em toda glória, prazeres e delícias da terra. Mas que eles tenham certeza que vai haver um tempo que seus poderes abomináveis com suas blasfêmias e idolatrias serão destruídos.

E, ao contrário de nós, somos aterrorizados, banidos, aprisionados e mortos aqui na terra por causa da confissão da santa Palavra de Deus; somos aterrorizados por aquele homem do pecado e inimigo de Deus, o papa anticristo de Roma; no entanto, no último dia, tomaremos a posse dos frutos de nossas esperanças – ou seja, o consolo eterno, a alegria e a salvação.

CCCCXCV.
O papa envia seus cardeais para todos os reinos – marotos, rabugentos, efeminados e cabeças-duras incultos, que acabam ficando a vontade nas cortes do rei entre damas e mulheres. O papa invadiu todos os países com esses cardeais e bispos. O alemão é levado cativo pelos bispos papistas, pois já contei mais de quarenta bispados, além de abadias e catedrais, que são mais ricos que os bispados. Agora existem na Alemanha apenas oito bispados e vinte principados, de modo que os bispos papistas são muito mais ricos e poderosos do que os príncipes do império.

CCCCXCVI.
O diabo gerou a escuridão; a escuridão gerou a ignorância; a ignorância gerou o erro e seus irmãos; o erro gerou o livre-arbítrio e a presunção; o livre-arbítrio gerou o mérito; o mérito gerou o esquecimento de Deus; o esquecimento gerou a transgressão; a transgressão gerou a superstição; a superstição gerou a satisfação; a satisfação gerou as ofertas; as ofertas geraram os padres; os padres geraram a incredulidade; a incredulidade gerou a hipocrisia do rei; a hipocrisia gerou o tráfico de ofertas para o lucro; o tráfico de ofertas para o lucro gerou o purgatório; o purgatório gerou as vigílias anuais; as vigílias anuais geraram a vida da igreja; a vida da igreja gerou a avareza; a avareza gerou o inchaço da superabundância; o inchaço da superabundância gerou a magnificência; a magnificência gerou a fúria; a fúria gerou a autoridade; a autoridade gerou o império e a dominação; a dominação gerou a grandiosidade; a grandiosidade gerou a ambição; a ambição gerou a simonia; a simonia gerou o papa e seus irmãos na época do cativeiro babilônico.

Após o cativeiro babilônico, o papa gerou o mistério da iniquidade; o mistério da iniquidade gerou a teologia sofística; a teologia sofística gerou a rejeição das Sagradas Escrituras; a rejeição das Sagradas Escrituras gerou a tirania; a tirania gerou a matança dos santos; a matança dos santos gerou a condenação de Deus; a condenação de Deus gerou a dispensação; a dispensação gerou o pecado voluntário; o pecado voluntário gerou a abominação; a abominação gerou a desolação; a desolação gerou a dúvida; a dúvida gerou a procura dos fundamentos da verdade e, a partir daí, o desolador, o papa, o anticristo em si é revelado.

São Paulo tinha dito que chegará um tempo onde as pessoas não suportarão mais a sã doutrina e também tinha dito que nos últimos dias os homens serão amantes de si mesmos, etc.

Quando li essas frases de São Paulo pela primeira vez, eu não imaginava Roma; eu pensava que estava falando sobre os judeus e sobre os turcos.

CCCCXCVII.
No Antigo Testamento, o ano do Jubileu era celebrado a cada quinquagésimo ano; o papa copiou essa celebração com o portão dourado; que trouxe benefícios e dinheiro para os papas; mais tarde eles mudaram o quinquagésimo para o quinto, e depois para o vigésimo; em seguida para o décimo quinto e depois para o sétimo ano; pois assim recebiam dinheiro com mais frequência.

CCCCXCVIII.
Se eu não fosse doutor, Satanás me faria trabalhar bastante. Não foi uma questão fácil para alguém alterar toda a religião do papado que é tão profundamente enraizada. Mas fiz um juramento no meu batismo que me manteria em Cristo e na sua Palavra, que eu acreditaria firmemente nele e renunciaria totalmente ao diabo e todas as suas mentiras. E, de fato, o juramento que fiz no meu batismo é renovado em todas as minhas tribulações; sem Cristo eu não teria resistido aos meus problemas, apesar de eles terem me dominado e acabado comigo. Eu teria voluntariamente mostrado obediência ao papa e aos bispos em qualquer circunstância; mas eles iriam me obrigar a negar a Cristo e fazer de Deus um mentiroso, além de reconhecer o Evangelho como uma heresia.

CCCCXCIX.
No Novo Testamento e na igreja cristã, a adoração a Deus consiste na mais pura e simples verdade; não existe superstições ou idolatrias; São João escreveu em sua epístola sobre as três testemunhas na terra: 1 – O Espírito, isto é, a função da pregação; 2 – Água, isto é, o batismo; 3 – Sangue, isto é, a ceia do Senhor. Mas o papa e seus espíritos sedutores condenam essas testemunhas inventando inúmeras adorações, cerimonias e oferendas; e os instituiu para a sua própria eleição sem as palavras de Deus, de modo que, através dos erros, a igreja é excluída das ordenanças de seu noivo.

D.
As cerimônias são apenas coisas intermediárias, instituídas para fins políticos; ou seja, observar as regras e que tudo na igreja possa proceder decentemente em ordem, como a lei da natureza também ensina e como contemplamos na criação de todas as criaturas.

DI.
Vem do próprio diabo a ideia que os papistas sustentam de serem a causa final de instituir as tradições humanas onde Deus é verdadeiramente adorado e, para isso, eles são necessários para a salvação. É algo monstruoso aceitar tais tradições humanas como as melhores obras do cristianismo, o que não são, visto que dizer ser necessário para a salvação e assim adquirir a graça, é um conceito que invalida as melhores obras e acabam sendo completamente rejeitadas por Deus.

A mesma superstição e abominação estava naquelas obras que eles chamam de opera supererogationis, isto é, as obras que eles tinham em excesso, e mais do que eles, os próprios frades, padres e freiras que precisavam e passaram a vender para os leigos.

DII.
Se pudéssemos preservar o catecismo e estabelecer escolas para as gerações futuras, teríamos vivido bem; quanto as cerimônias, eles podem ir aonde quiserem, pois são o pó da terra que dão ocasião a superstição; pessoas que se acham necessárias para a salvação e que a sua omissão é pecado.

DIII.
A abstinência dos papistas é o assassinato certeiro pelo qual muitas pessoas foram destruídas devido ao jejum rigoroso e, principalmente, comendo um alimento específico de modo que a força da natureza seja totalmente enfraquecida.

Por essa causa, Gerson foi forçado em Paris a escrever um livro sobre o conforto para consciências perturbadas e perplexas até o fim, então eles não podem ser desencorajados e nem entrarem em desespero; para aqueles que se abstém e enfraquecem suas forças. Não havia ensinamento e nem pretendiam ensinar os dez mandamentos, o credo e a oração do Senhor devido a tamanha escuridão que existiu no papado.

DIV.
Existem dois tipos de santidade, substancial e acidental; São Francisco foi substancialmente santo através da fé em Jesus Cristo, mas acabou se apaixonando pela santidade acidental do capuz, um acessório estranho à santidade. Ah Deus! Não é através do tipo de vestimenta que nos dará um passe para o céu.

DV.
Lutero recebeu notícias da Dinamarca onde o rei e o duque de Holstein ordenaram um jejum de três dias como uma espécie de admoestação ao povo à oração e à paz; ao que ele disse: é uma conduta justa e boa; Eu gostaria que todos os outros príncipes e reis fizessem o mesmo; quando é uma humildade não só da aparência, mas também do fundo do coração é muito boa.

DVI.
O papado se posiciona sobre a missa de duas maneiras: primeiro, espiritualmente, sustentando que a missa é uma adoração a Deus; em segundo lugar, corporalmente, para a missa ser mantida não divinamente, mas sim pelos príncipes e entre outros governos temporais.

A missa é a rocha do papista, tanto espiritual quanto carnal; e agora que o espiritual caiu, o tempo que Deus destruirá a carne também está próximo.

DVII.
A missa privada, desde os tempos de Gregório, agora com mais de oitocentos anos, enganou muitos santos. John Huss foi levado cativo por aquela coisa pintada e enganosa. Eu me pergunto como Deus me tirou dessa idolatria. Já faz três anos que alguém me certificou que a Ásia não celebra mais a missa privada. Estou certo que na Armênia, na Etiópia, na Índia e nos países do leste existem muitos cristãos que nunca celebraram a missa.

A missa na França não era tão estimada quanto na Alemanha; pois quando pela manhã alguém ouvia um estúpido, não se importava mais com quantos eram mantidos, mas passava por eles sem mostrar qualquer consideração pessoal. Quando o rei francês ouvia a missa, ele sempre trazia uma coroa francesa para o padre, e o padre o colocava sobre um livro que foi comprado e mantido diante dele.

DVIII.
O cânon da missa é unido com muitas mentiras. Os gregos não o possui. Quando eu estava na Itália, vi que em Milão também não tinha tal cânone, e quando me ofereci para celebrar a missa lá, eles me disseram: Nos sumus Ambrosiani. Também me disseram que antigamente havia uma discussão entre eles se deveriam receber na igreja o livro de Ambrósio ou o de Gregório, e então eles oraram a Deus para algum milagre decidir por eles. Naquela noite eles colocaram os dois livros na igreja; pela manhã, encontrei o livro de Ambrósio completamente inteiro e imóvel sobre o altar-mor, mas o livro de Gregório estava rasgado em pedaços e espalhados pelos cantos da igreja. Então eles interpretaram assim: Ambrósio deve permanecer em Milão sobre o altar, já Gregório deve ser espalhado por todo o mundo.

DIX.
Os ornamentos e trajes alegres usados no papado durante a celebração da missa e entre outras celebrações foram parcialmente retirados de Moisés e parcialmente retirados dos pagãos. Pois os sacerdotes observaram que as apresentações e peças teatrais realizados nos mercados atraíam e recreavam o povo; então eles foram levados a instituir tais apresentações também na igreja para atrair crianças e pessoas incultas. Passaram a utilizar brinquedos na véspera de Pascoa não por devoção, mas para recreações tolas.

DX.
Quando eu era um jovem frade em Erfurt e precisava ir para as aldeias comprar pudim e queijo, eu tinha ido a uma pequena cidade onde celebrava uma missa. Quando eu coloquei minha vestimenta e me aproximei do altar, o sacristão começou alegremente a tocar Kirieleison no alaúde o que me fez dar vontade de rir; então me senti obrigado a afinar meu Gloria in excelsis de acordo com o Kirieleison dele.

DXI.
Os judeus faziam suas oferendas es opere operata; quando uma obra era realizada apenas externamente, eles achavam que os pecados eram reconciliados, enquanto que todas as suas ofertas e sacrifícios deveriam ter sido sinais de ação de graças.

Assim é o mesmo erro papista na missa, onde o padre, um burro inculto, se oferece a dar plena satisfação pelos pecados.

DXII.
A missa deve ser abolida por duas razões: Primeiro porque o entendimento natural julga ser uma forma desonesta de comércio e lucro celebrar missa por dois pence, ou vendê-la por três e meio pence. Em segundo lugar porque, de acordo com a questão espiritual, é considerado uma idolatria abominável, pois demonstra que Cristo morreu em vão pretendendo assim fazer plena satisfação pelos pecados por meio da obra. Esses dois abusos são totalmente inaceitáveis, imperdoáveis, no entanto, todas as universidades juraram em manter a missa. Jamais devemos concordar com esses papistas em relação a este ponto. Pois se eles permitirem que a missa seja abolida, eles precisariam estornar tudo aquilo que eles obtiveram dos imperadores, reis, príncipes, nobres e outras pessoas através de suas pregações mentirosas.

DXIII.
Muitos italianos estão bem inclinados à religião protestante, e teriam ficado bem mais satisfeitos com ela se eu não tivesse tocado na missa para rejeitar o que eles consideravam uma heresia abominável. Eles dependem disso com tanta certeza que acham que quem ouviu a missa está livre de todo o perigo do pecado, ou seja, tudo o que ele faz com as mãos, nenhum mal irá acontecer; não é a toa que após ouvir a missa, muitos pecados e assassinatos são cometidos. Quando eu estava em Roma, havia alguém que estava procurando seu inimigo durante dois anos para poder se vingar dele, mas não tinha conseguido encontrá-lo; por fim, avistou-o na igreja onde ele próprio tinha ouvido a missa; tendo acabado de se levantar diante do altar, ele imediatamente se aproximou do inimigo, esfaqueou-o até a morte e fugiu. Meu livro sobre a abolição da missa é escrito com muita veemência contra os blasfemadores, mas não são para aqueles que estão entrando no verdadeiro caminho, que acabaram de nascer para a nova vida; esses não devem ser ofendidos; se vinte anos atrás alguém ousou tirar a missa de mim na base da força, então ele conseguiu; pois meu coração dependia disso e eu a adorava; agora, Deus seja louvado, tenho um outro conceito e tenho plena certeza de que o fundamento e a base da missa e do papado nada mais é do que a impostura, a extorsão e a idolatria.

DXIV.
A missa vem da palavra hebraica Mausim, isto é, uma coleta de esmolas, um estipêndio ou um imposto pela causa dos sacerdotes ou de outras pessoas consideradas importantes. A missa devorou somas infinitas de dinheiro.

 

Fonte: CRTA - Center for Reformed Theology and Apologetics - reformed.org
Tradução: Marcell de Oliveira


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