A TEOLOGIA E A VIDA ESPIRITUAL NA BAIXA IDADE MÉDIA


Categoria: Historiografia
Imagem: Giovanni di Paolo, Thomas Aquinas defeats the philosopher Averroes (1450), St. Louis Art Museum, Missouri, USA. - Universitat Wlen
Publicado: 20 de Janeiro de 2013, Domingo, 12h31

Uma Época de Ansiedade

A baixa Idade Média em geral é descrita sobretudo sob o aspecto do declínio, da desintegração e da decadência, uma interpretação que se reflete no título de um estudo clássico desse período, The Waning of the Middle Ages [O Declínio da Idade Média], de Johan Huizinga. Época de adversidade e instabilidade, os séculos XIV e XV tornaram-se terra de ninguém entre a síntese medieval do século XIII, com suas catedrais góticas e sumas escolásticas, e os grandes movimentos reformadores do século XVI.

De fato, longe de ser uma época de decadência vazia, os dois séculos anteriores à Reforma mostraram-se singularmente vitais em face de desafios e mudanças sem precedentes. Se proliferavam os desmandos na igreja, o mesmo ocorria com os apelos pela reforma. Novas formas de piedade leiga, tratados devocionais no vernáculo, renovado interesse nas relíquias, nas peregrinações e nos santos, movimentos religiosos populares – os lollardos na Inglaterra, os hussistas na Boêmia, os valdenses e os franciscanos espirituais na Itália e na França – todos testificam uma espiritualidade firmemente arraigada e até frenética. De fato, vemos um sólido crescimento no poder e na profundidade dos sentimentos religiosos até a época da Reforma.

Isso não significa negar que a sociedade da baixa Idade Média também enfrentou intensas sublevações políticas, econômicas e sociais, assim como religiosas. O parecer do poeta Eustache Deschamps expressa um sentimento geral de desânimo e melancolia: “Agora o mundo está covarde, decaído e fraco, velho, cobiçoso, com as línguas confusas/ vejo apenas fêmeas e machos estúpidos/ o fim se aproxima, na verdade […] tudo vai mal“. [1] De fato, essa sensação de mal-estar, essa expressão de que o tempo estava fora dos eixos, aliada à crescente onda das expectativas religiosas, produziu uma época de excepcional ansiedade.

Paul Tillich, em seu livro The Courage to Be [A Coragem de Ser], esboçou a história da civilização ocidental sob o aspecto de três tipos de ansiedade. [2] O fim da antigüidade clássica foi marcada pela ansiedade ôntica, uma inquietação profunda com o destino e com a morte. Perto do fim da Idade Média, a ansiedade da culpa e da condenação predominou. Por sua vez, abriu caminho, no fim da Era Moderna, à ansiedade espiritual do vazio e da falta de sentido.

Embora não discordemos da tese de Tillich acerca da crise moral nas vésperas da Reforma, na realidade os três tipos de ansiedade estavam amplamente presentes. Morte, culpa e perda de sentido ressoam em marcante dissonância na literatura, na arte e na teologia desse período.

Esses três temas emergem vividamente na luta de Lutero por encontrar um Deus misericordioso. Amedrontado por uma tempestade e receando a morte iminente, Lutero fez o voto de tornar-se monge. Já no mosteiro, foi assaltado por uma esmagadora sensação de culpa. Mais terríveis eram os ataques de medo e desespero, as Anfechtungen, como Lutero os chamava, quando ele vacilou e quase sofreu um colapso.

Mesmo sendo a peleja de Lutero algo pessoal, ela é a epítome dos medos e das esperanças de sua época. Era, poderíamos dizer, simplesmente como todos os outros, talvez apenas algo mais. Além disso, sua doutrina da justificação e sua teologia da igreja, que se desenvolveu a partir dela, falaram poderosamente às concepções principais do seu tempo. Nesse aspecto, a teologia dos reformadores foi uma resposta específica à ansiedade especial da época.

Um desassossego mórbido com o sofrimento e a morte impregnou a Europa na baixa Idade Média. Na raiz dessa experiência, estavam os fenômenos geminados da fome e da peste. No início do século XIV, a crise agrária era tão intensa, que alguns recorrem ao canibalismo: em 1319, noticiou-se que cadáveres de criminosos eram tirados das forcas e comidos pelos pobres na Polônia e na Silésia. [3] Acrescente-se a tal catástrofe a destruição provocada pela peste bubônica, ou peste negra, que atingiu o ápice na Inglaterra por volta de 1349 e arrasou pelo menos um terço da população de toda a Europa. Os episódios da peste repetiram-se até o século XVI, quando uma nova peste, a sífilis, foi trazida do Novo Mundo pelos marinheiros de Cristóvão Colombo. [4] Além desses desastres “naturais”, a invenção do canhão de pólvora transformou a guerra numa nova selvageria. [5]

A visão da morte manifestava-se nos sermões e nas xilogravuras, assim como na pintura e na escultura daqueles tempos. As sepulturas eram freqüentemente adornadas com imagens de cadáveres nus, com bocas escancaradas, punhos cerrados e entranhas devoradas por vermes. Uma das mais populares representações pictóricas foi a “dança da morte”. A morte, na forma de esqueleto, aparecia como uma figura dançante tragando suas vítimas. Ninguém podia escapar de suas mãos – nem o rico mercador, nem o corpulento monge, nem o pobre camponês. Em geral, uma ampulheta era colocada num canto do quadro, a fim de lembrar a quem o contemplasse que a vida estava passando rapidamente.

A certeza da morte era tema usual para os pregadores também. Ricardo de Paris, um frade franciscano, pregou certa vez durante dez dias consecutivos, sete horas por dia, sobre o tópico das últimas quatro coisas: a morte, o juízo, o céu, o inferno. Ele entregou seus sermões, bastante adequadamente, no Cemitério dos Santos Inocentes, o mais popular de Paris. Não menos insólito, foi João Capistrano, de sua época, que levou uma caveira para o púlpito e advertiu sua congregação: “Olhem e vejam o que resta de tudo aquilo que uma vez lhes deu prazer, ou que outrora levou-os a pecar. Os vermes comeram tudo“. [6]

Teodoro Beza, que sucedeu João Calvino como reformador de Genebra, relembra que uma grave doença e o medo da morte ocasionaram sua conversão à religião reformada.

Ele se aproximou de mim mediante uma doença tão grave que me desesperei. Vendo seu terrível julgamento sobre mim, não conseguia pensar no que fazer com minha vida infeliz. Finalmente, depois de um sofrimento interminável de corpo e alma, Deus mostrou misericórdia por seu desgraçado servo perdido e consolou-me de modo que eu não podia duvidar de seu amor. Com milhares de lágrimas, renunciei ao antigo eu, implorei seu perdão, renovei meu juramento de servir sua verdadeira igreja, em suma, dei-me inteiramente a ele. Assim, a visão da morte a ameaçar minha alma fez surgir em mim o desejo de uma vida verdadeira e eterna. Assim, a doença foi para mim o começo da verdadeira saúde. [7]

De fato, a morte era uma realidade sempre presente para homens e mulheres na véspera da Reforma. A íntima relação entre morte e culpa é percebida nesta declaração de Calvino: “De onde vem a morte, senão da ira de Deus contra o pecado? Daí surge o estado de servidão ao longo de toda a vida, que é a ansiedade constante na qual as almas infelizes estão aprisionadas“. [8] A ansiedade moral, que Tillich entendeu ser o tema dominante da época, surgiu do fato de que a morte implicava julgamento, e o julgamento colocava o pecador face a face com um Deus santo e irado. A amostra mais terrível dessa situação é vista na cena freqüentemente retratada do leito de morte, onde anjos e demônios lutam igualmente pela posse da alma do moribundo.

Houve diversas tentativas de aliviar a culpa que pesava tão fortemente na alma das pessoas. A mais radical de todas eram as várias companhias de flagelantes, ascetas rigorosos que viajavam de cidade em cidade, açoitando-se publicamente com chicotes de couro, na esperança de expiar pecados seus e da sociedade. [9] A maioria dos pecadores preferia os meios mais usuais de perdão: os sacramentos e os auxílios parassacramentais autorizados pela igreja. Indulgências, peregrinações, relíquias, veneração dos santos, o rosário, dias de festa, adoração da hóstia consagrada, a repetida reza do “pai-nosso” – tudo isso era parte de um sistema de penitências mediante o qual assegurava-se uma maneira apropriada de estar perante Deus. [10] Se o pecador tivesse como pagar, ele poderia reservar uma doação para que se rezassem missas a seu favor após sua morte. O Imperador Carlos V deixou uma provisão para 30000 dessas missas, ao passo que Henrique VIII da Inglaterra, que quis ter certeza em dobro, exigiu que fossem rezadas missas por ele “enquanto durasse o mundo”. [11]

Em nenhum outro lugar era mais evidente o caráter opressivo dos deveres da vida religiosa da baixa Idade Média do que nos manuais de confissão e nos catecismos para leigos, que se imprimiram em abundância nas recém-inventadas prensas tipográficas. Steven Ozment, em sua análise desses documentos, mostra que a confissão, longe de transmitir um sentimento de perdão, apenas reforçava um já maciço peso de culpa. [12]

Uma criança estava capacitada para a confissão já com a idade de sete anos, o reconhecimento medieval da “idade da responsabilidade”. Ela apresentava-se ao padre, recitava o pai-nosso e o credo e depois respondia às perguntas do sacerdote. As perguntas eram preparadas para mostrar à criança as várias maneiras pelas quais poderia ter transgredido os dez mandamentos. Poderiam perguntar-lhe, por exemplo:

Você acredita em magia? Ama mais a seus pais do que a Deus? Você alguma vez não ajoelhou com os dois joelhos, ou não tirou seu chapéu durante a comunhão? – Esses são os pecados contra o primeiro mandamento.

Você cortou madeira, fez alçapões para passarinhos, fugiu da missa ou dos sermões, ou dançou num domingo ou em dias santos? – Esses são pecados contra o terceiro mandamento.

Você jogou bolas de neve ou pedras nas pessoas? Foi cruel com galinhas ou patos? Você matou o imperador com um machado duplo? [Uma pergunta capciosa para ver se a criança estava prestando atenção!] – Esses são pecados contra o quinto mandamento.
 [13]

Semelhantemente, para os adultos penitentes, as perguntas eram formuladas a fim de provocar introspecção, meticulosidade e uma sensação de não atingir uma confissão completa: “Você questionou o poder e a bondade de Deus ao perder um jogo? Resmungou contra Deus por causa de mau tempo, doença, pobreza, a morte de uma criança ou de um amigo? Vestiu-se de maneira orgulhosa, cantou e dançou sensualmente, cometeu adultério, flertou com mulheres, ou trocou olhares adulterinos na igreja ou enquanto passeava no domingo? Você é uma mulher que abortou artificialmente uma criança, ou matou uma criança recém-nascida e não-batizada? Abortou por excesso de trabalho, diversão ou atividade sexual? Roubou peregrinos no caminho para Roma? Pensou em cometer adultério? Sodomia? Incesto?“. [14]

A pressão para se purificar de todo pecado, incluindo-se os motivos interiores e, às vezes, irreconhecíveis, colocava um peso insuportável sobre o penitente. Depois de tal confissão ser feita, ainda era preciso realizar obras de reparação, antes que a absolvição pudesse ser solicitada. Daí o ativismo febril da religião no fim da Idade Média: a construção de novas igrejas, o comércio de indulgências, o esforço incessante para obter méritos. [15]

Além de tudo isso, claro, assomava o espectro do purgatório e do inferno, cujos tormentos eram retratados em detalhes aterradores na arte, na escultura e na pregação daqueles dias. Jean Gerson, importante reformador do início do século XV, descreveu a índole religiosa de sua época como imaginário melancholia, “uma imaginação melancólica”. [16] Exemplo dessa imaginação é a vívida descrição feita por Sir Thomas More acerca dos horrores do purgatório. Em seu Suplication of Souls [Súplica das Almas] (1529), More colocou as seguintes palavras na boca de um morto atormentado:

Se tendes pena dos cegos, não há ninguém tão cego quanto nós, que estamos aqui na escuridão, salvo as visões desagradáveis e repugnantes, até que venha algum conforto. Se tendes pena dos aleijados, ninguém é tão aleijado quanto nós, que não podemos colocar um pé para fora do fogo, nem temos as mãos livres para proteger nosso rosto das chamas. Finalmente, se tendes pena de qualquer homem em sofrimento, nunca conhecestes sofrimento comparável ao nosso, cujo fogo é muito mais ardente que o de qualquer outro lugar na terra e mais quente do que pareceria uma labareda pintada numa parede. Se já ficastes doentes, pensastes como a noite era longa e ansiastes pela manhã, quando cada hora parecia durar mais que cinco, pensai então que longa noite nós, almas tolas, padecemos, em insônia, sem descanso, queimando e torrando no fogo por uma longa noite de muitos dias, de muitas semanas, de muitos anos juntos. […] Vós tendes vossos médicos, que às vezes vos curam e confortam; nenhum médico poderia ajudar em nosso sofrimento, nem emplastro algum aplacaria nossa febre. Vossos guardas vos fazem bem e vos deixam em conforto; nossos guardas são aqueles de quem Deus vos guarda – cruéis, espíritos malditos, ofensivos, invejosos e odiosos, inimigos aversivos e atormentadores maliciosos, cuja companhia é mais horrível e atroz para nós do que o sofrimento em si: e o tormento intolerável que nos infligem, por meio do que, de todas as maneiras, não cessam jamais de nos despedaçar. [17]

Se o purgatório era tão ruim, quão incomparavelmente pior o inferno haveria de ser? Um catecismo ilustrado mostrava os habitantes do inferno consumindo as próprias entranhas, e adicionava o seguinte comentário: “O sofrimento causado por uma fagulha do fogo do inferno é ainda maior do que aquele provocado por mil anos de trabalho de parto“. [18] Um dos portais de igreja na catedral de Mogúncia descreve o juízo final: Cristo, o Juíz, está no topo, os redimidos estão sendo levados por anjos para o Paraíso, enquanto os amaldiçoados, com rostos contorcidos, estão sendo transportados acorrentados por demônios até o inferno. Esse tema, comum a todas as principais igrejas da Europa, refletia o etos medieval de um Deus de ira e juízo, diante de cuja ira os homens culpados poderiam apenas estremecer.

Os temas da morte e da culpa estão relacionados ao que era talvez a ansiedade dominante na sociedade da baixa Idade Média, uma crise de sentido. Em todas as áreas da vida, as antigas fronteiras estáticas vinham sendo transgredidas. As viagens de Colombo, Vespúcio e Magalhães despedaçaram a antiga geografia e ampliaram imensamente a esfera de influência européia. O mote medieval para Gibraltar – ne plus ultra – tornou-se simplesmente plus ultra – mais além. Ao mesmo tempo, os cálculos de Copérnico, mais tarde confirmados pelas observações de Galileu e Kepler, estenderam amplamente as fronteiras do universo removendo a terra – e a humanidade – do centro da realidade criada. [19] As fronteiras políticas entre as nações estavam literalmente prontas para ser capturadas, como indicam a Guerra dos Cem Anos, entre Inglaterra e França, e a incursão de Carlos VIII à Itália (1494). Do outro lado da escala social, os camponses lutavam por livrar-se das correntes do feudalismo mediante protestos e súplicas, quando possível, e mediante revoltas sanguinárias, quando necessário.

Todas essas situações levantaram questões novas e radicais para a cultura da baixa Idade Média. A cosmovisão de um universo ordenado, organizado num sistema fixo de hierarquia celestiais, perfeitamente refletido numa sociedade harmoniosa na terra, tornou-se cada vez menos sustentável. Shakespeare, escrevendo no rumo desses desdobramentos, mas ainda usando imagens pré-copernicanas, expressa a sensação daquela época:

… mas quando os planetas
Em maligna mistura de desordem extraviam-se,
Que pestes e que portentos! que rebeliões!
Que bramido do mar! tremor de terra!
Comoção dos ventos! medos, mudanças, horrores,
Desviam e estalam, despedaçam-se
A unidade e o calmo casamento dos estados
Em sua fixidez. Oh, quando as hierarquias se abalam,
Degraus de todos os altos desígnios,
O empreendimento adoece.
 [20]

A dilapidação cósmica, com seu sucedâneo na terra, a inquietação social e religiosa, responde, em parte, pela obsessão dominante pelo mundo estranho do oculto, nas vésperas da Reforma. Em 1484, o Papa Inocêncio VIII expediu sua bula Summis Desiderantes, que autorizava dois inquisidores dominicanos a empreender o extermínio sistemático da bruxaria. Por sua vez, eles produziram o infame livro Malleus Maleficarum, ou “Martelo das Bruxas”, um texto oficial contendo instruções precisas sobre investigação e condenação de bruxaria. Na histeria da feitiçaria que se seguiu, milhares de mulheres pobres, velhas e dsprotegidas (porque solteiras) foram sujeitadas a torturas inomináveis. Ao todo, por volta de 30000 execuções por feitiçaria aconteceram até o fim do século XVI. [21] As bruxas eram acusadas de todos os tipos de calamidade: tempestades, seca, morte de animais da fazenda, impotência sexual. Da mesma forma, a conexão entre feitiçaria e heresia em geral era aceita. Portanto, não é de surpreender que os detratores católicos de Lutero fizessem circular o inescrupuloso boato de que ele havia nascido na ilícita união entre sua mãe (uma bruxa!) e um íncubo. [22]

Vimos que, longe de ser um período de declínio, a baixa Idade Média estava viva, repleta de todos os tipos de vitalidades espirituais. Conforme Lucien Febvre a descreveu, era uma época de “imenso apetite pelo divino”. [23] A sede de Deus às vezes refletia em padrões bizarros de espiritualidade: zurrar na missa em homenagem ao jumento que Maria montou, tatuar o nome de Jesus no peito, sobre o coração, venerar hóstias sangrentas. Mais freqüentemente, seguia os conhecidos caminhos da espiritualidade comum. Em cada caso, porém, era considerada por muitos uma espiritualidade profundamente insatisfatória. O moralismo nervoso e as tentativas incessantes de aplacar um Deus sublime e irado serviram para agravar as ansiedades fundamentais de morte, culpa e perda de sentido. A maior realização da Reforma foi ter sido capaz de redefinir essas ansiedades sob o aspecto de novas certezas, ou melhor, velhas certezas redescobertas. O mal-estar espiritual da baixa Idade Média não foi a causa da Reforma, mas certamente constituiu seu pré-requisito.

Dissemos muito pouco sobre as famigeradas contravenções da igreja pré-reformada: simonia, nepotismo, mau uso dos benefícios, concubinato clerical, etc. Todos os reformadores, quer católicos, quer protestantes, quer radicais, opuseram-se de maneira extrema a essas práticas. Entretanto, alguns entre eles também perceberam que era necessário haver algo mais do que um pôr a casa em ordem. Não seria de nenhuma utilidade varrer as teias de aranha se os alicerces estavam podres. O que se precisava era de uma nova definição da igreja, baseada numa compreensão renovada do evangelho.

A Busca pela Verdadeira Igreja – Intimamente relacionada com a ansiedade que marcou todos os aspectos da vida na baixa Idade Média estava uma crise de confiança na identidade e na autoridade da igreja. Ao contrário das doutrinas da trindade e da cristologia, que foram objeto de definições conciliares oficiais na igreja primitiva, a doutrina da igreja nunca recebeu tal condição dogmática. Nem Pedro Lombardo, em seu Livro de Sentenças, nem Tomás de Aquino, em sua Summa Theologia, tiveram um local à parte para a igreja em suas teologias sistemáticas. Entretanto, do século XIV em diante, numerosos tratados apresentavam o título De Ecclesia. Essa explosão de interesse pela eclesiologia coincidiu com grandes mudanças institucionais, tanto dentro da Igreja quanto em relação às crises sociais e políticas de que já tratamos.

A Reforma é sempre retratada como tendo abalado a unidade da igreja medieval, legando ao mundo moderno o legado de uma cristandade dividida. Quando olhamos mais de perto os séculos anteriores à reforma, porém, descobrimos uma pluralidade de formas e doutrinas eclesiais. Os reformadores protestantes, como veremos, também divergiam entre si a respeito da natureza e da função da igreja e de seu ministério. A reforma do século XVI, portanto, foi uma continuação da busca pela igreja verdadeira que havia começado muito antes que Lutero, Calvino ou os padres de Trento entrassem na lista. [24] Examinemos brevemente cinco modelos conflitantes da igreja na baixa Idade Média.

O Curalismo
Nos tempos medievais, a Curia Romana referia-se à corte papal, incluindo-se todos os oficiais e funcionários que assistiam o papa em seu governo da igreja. O curialismo, portanto, era uma teoria de governo eclesiástico que investia de suprema autoridade, tanto temporal quanto espiritual, as mãos do papado.

A Igreja de Roma, com sua dupla filiação apostólica (tanto Pedro quanto Paulo foram martirizados em Roma), logo reivindicou um tipo de hegemonia espiritual. As raízes da soberania papal, entretanto, remontam à conversão de Constantino e à subseqüente “cristianização” do Império Romano. [25] Esse evento, conjugado às invasões bárbaras do V século, deixaram o bispo de Roma numa posição politicamente estratégica. A relação entre as esferas temporal e espiritual – geralmente citadas como “as duas espadas” (Lc 22.38) – recebeu uma formulação clássica do Papa Gelásio I, que, numa carta de 494 ao Imperador Anastácio, declarou:

Duas coisas há, augusto imperador, pelas quais esse mundo é dirigido: a autoridade sagrada [auctoritas] do sacerdócio e o poder real [potestas]. Dessas, a responsabilidade dos sacerdotes tem maior peso. […] E, se os corações dos cristãos devem-se submeter a todos os sacerdotes em geral […] quão maior consentimento deve ser dado ao bispo daquela sé, o qual o Altíssimo deseja que seja preeminente sobre todos os sacerdotes e a quem a devoção da igreja sempre tem honrado. [26]

Mesmo tendo sido o poder papal significativamente reduzido no feudalismo, o princípio gelasiano foi reafirmado com muita força na alta Idade Média. Os pronunciamentos de três papas em particular constituem a mais alta marca das exigências papais à preeminência secular. O Papa Gregório VII, no clímax da controvérsia das investiduras em 1075, lançou seu famoso Dictatus Papae, uma lista de 27 afirmações sobre o poder papal. Ele reivindicava, por exemplo, que o papa “é o único que deveria ter os pés beijados por todos os príncipes“, que o papa podia depor imperadores, convocar sínodos e absolver os súditos das obrigações feudais. Mais ainda, ele insistia que “a Igreja Romana nunca errou, nem nunca, pelo testemunho das Escrituras, errará por toda a eternidade“. [27] O papa que esteve mais perto de colocar em prática os “Ditames” de Gregório foi Inocêncio III (1198-1216), que reinou sobre um vasto império. Ele acreditava que, na hierarquia do ser, o papa ocupava uma posição intermediária entre o divino e o humano – “inferior a Deus, porém superior ao homem“. Ele comparava-se à “luz maior” que Deus colocara no firmamento da igreja universal, em face da qual todas as outras autoridades (i.e., o Imperador) não passavam de pálidos reflexos. [28] Baseado na obra de seus predecessores, o Papa Bonifácio VIII anunciou as mais extravagantes alegações da soberania papal em sua bula Unam Sanctam (1302). Como houve uma única arca, guiada por apenas um timoneiro, assim também havia “uma única santa, católica e apostólica igreja“, presidida por um supremo poder espiritual, o papa, que podia ser julgado apenas por Deus, não pelos homens. Dessa forma, ele concluiu: “Declaramos, estabelecemos, definimos e pronunciamos que, para a salvação, é necessário que toda criatura humana esteja sujeita ao Pontífice Romano“. [29]

O pontificado de Bonifácio marcou o fim de uma etapa e o início de outra na história do papado. Sua morte foi seguida pelos 70 anos de exílio do papado em Avinhão, o chamado Cativeiro Babilônico (1309-1377), e pela chocante confusão do Grande Cisma Ocidental (1378-1417), quando, durante algum tempo, dois e, mais tarde, três papas alegaram simultaneamente ser o cabeça supremo da igreja. A ineficácia dos esforços de Bonifácio por empunhar as espadas tanto do poder espiritual quanto do temporal foi reconhecida por muitos de sua época. Assim, Dante, que colocou Bonifácio num dos mais baixos círculos do inferno, junto com mais dois papas simoníacos, descreve as conseqüências da posição curialista: “… visto que a igreja procurou ser dois governos ao mesmo tempo, ela está afundando muito, conspurcando tanto seu poder quanto seu ministério“. [30]

O Conciliarismo
No início do século XV, a demanda por uma reformatio in capite et in membris – reforma na cabeça e nos membros – ecoou por toda a Europa. Conforme um teólogo contemporâneo expressou:

O mundo todo, o clero, todos os cristãos, sabem que uma reforma da igreja é tanto necessária quanto oportuna. O céu e os elementos a exigem. Está sendo requerida pelo sacrifício do sangue precioso que sobe aos céus. As próprias pedras logo serão constrangidas a se unir a essas vozes. [31]

O espectro do corpo de Cristo dividido em obediência a três papas, cada um proferindo anátemas e interditos aos outros dois, tornou urgente o apelo por uma reforma. Dessa crise, surgiu a visão conciliar da igreja, que afirmava a superioridade dos concílios ecumênicos sobre o papa no governo e na reforma da igreja.

No âmago da teoria conciliar, havia a distinção fundamental entre a igreja universal (representativamente composta num concílio geral) e a Igreja Romana (consistindo no papa e nos cardeais). [32] Na lei canônica já se apresentara um escape à doutrina de que o papa estava acima do julgamento humano na oração – nisi deprehendatur a fide devius, “a menos que se desvie da fé”. [33] Esse desvio era interpretado não apenas como heresia manifesta, mas também como atos que ameaçassem a integridade da igreja.

A pergunta ainda persistia: no caso de um cisma múltiplo, quem estaria qualificado para manter os papas responsáveis? Guilherme de Occam declarou que qualquer cristão, mesmo uma mulher, poderia conclamar um concílio geral num momento de emergência. Depois de várias tentativas malsucedidas de resolver a crise (e. g., por renúncia forçada e negociação), o Concílio de Constança, convocado pelo Imperador Sigismundo, reuniu-se em 1414. Os três papas foram destituídos. Um novo papa, Martinho V, foi eleito, e o Grande Cisma Ocidental foi sanado. O papado fora salvo – pelo concílio!

A teoria conciliar, conforme apresentada por pensadores como Pierre d’ Ailly (m. 1420), Jean Gerson (m. 1429) e Dietrich de Niem (m. 1418), não visava a abolir o papado, mas relegá-lo ao papel que lhe era próprio dentro da igreja como um todo. Eles declaravam de fato que a plenitudo potestatis, “a plenitude de poder”, residia somente em Deus, não em qualquer indivíduo, nem mesmo no papa. Os conciliaristas advogavam um papa, uma igreja indivisível e um programa de reforma moral com base no exemplo da igreja primitiva. Tal programa, se tivesse sido executada, teria reduzido em muito a imensa riqueza da cúria, eliminando muitas fontes de sua renda: isenções, desobrigações, benefícios, indulgências plenárias e assim por diante. O fracasso do movimento conciliar contribuiu em parte para o sucesso da revolta protestante contra Roma, como também os contínuos pedidos por reforma dos muitos que permaneceram fiéis a Roma.

Mesmo tendo o Concílio de Constança aprovado dois decretos, o Sacrosancta (1415), afirmando a supremacia conciliar, e o Frequens (1417), ordenando que futuros concílios fossem convocados em intervalos regulares, o final do século XV assistiu ao ressurgimento da monarquia papal e à extinção do movimento conciliar. O dobre fúnebre do conciliarismo pode ser ouvido na bula papal Execrabilis, promulgada pelo Papa Pio II, em 1460.

Um abuso horrível, nunca ouvido em tempos antigos, brotou em nossa época. Alguns homens, imbuídos de espírito de rebelião […], acreditam poder apelar do Papa, vigário de Jesus Cristo […], para um futuro concílio, […] Desejosos, portanto, de banir esse veneno mortal da igreja de Cristo […] condenamos os apelos desse tipo, rejeitamo-los como errôneos e abomináveis e declaramo-los completamente nulos e inúteis. [34]

O decreto ainda advertia que qualquer um que tentasse burlar essa ordem seria imediata e irrevogavelmente excomungado. Execrabilis praticamente anulou tanto o Sacrosancta quanto o Frequens, pondo fim à era da reforma conciliar. Derovante, a reforma – dentro da igreja – só poderia ser instaurada pelo papa.

Wycliffe e Hus
Além de dar fim ao Grande Cisma, o Concílio de Constança também declarou heréticos os ensinos do teólogo inglês João Wycliffe (m. 1384) e ordenou que seus ossos fossem exumados da terra e queimados. Depois, voltaram-se para condenar à morte na fogueira o expoente principal das concepções de Wycliffe, o reformador boêmio João Hus (m. 1415). Tanto Wycliffe, “a Estrela d’ Alva da Reforma”, quanto Hus são freqüentemente referidos como precursores da Reforma. De fato, o tratado de Hus, De Ecclesia, teve um papel importante na ruptura posterior de Lutero com o papado. Em certo momento, Lutero foi forçado a confessar: “Somos todos hussitas agora”. [35] Mais tarde, ele percebeu que sua afinidade com Wycliffe e Hus era apenas provisória; nenhum deles se aproximou de sua compreensão radical da justificação somente pela fé. [36] Entretanto, suas próprias eclesiologias radicais contribuíram significativamente para o desenvolvimento da doutrina de Lutero acerca da igreja.

Wycliffe, a quem Gordon Rupp conferiu o título de “o Kierkegaard da baixa Idade Média”, levantou um causticante ataque contra a cristandade de seus dias. Ele denunciou os sacerdotes de “ladrões […] raposas malignas […] glutões […] demônios […] macacos” e os curas de “rebentos estranhos, não arraigados à vinha da igreja“. O papa era “o vigário principal do demônio“, e os mosteiros, “antros de ladrões, ninhos de serpentes, lares de demônios vivos“. [37]

O estridente anticlericalismo de Wycliffe surgiu de sua definição da igreja como o corpo predestinado dos eleitos. Mais tarde, Hus fez ecoar a idéia de Wycliffe: “A unidade da Igreja Católica reside no vínculo da predestinação, e na meta da bênção, visto que todos os seus filhos estão, no fundo unidos em bênção“. [38] A igreja universal não era, conforme os conciliaristas haviam sustentado, a congregação dos fiéis espalhados pela terra, mas sim o grupo dos eleitos estendidos através do tempo. A igreja na terra, a igreja visível, não podia ser identificada com a verdadeira igreja, já que contava entre seus membros os réprobos – os “previstos” (praesciti), como Wycliffe os chamava – e também os redimidos.

Wycliffe dividiu a igreja em três partes: a igreja triunfante (incluindo-se os anjos) no céu, a igreja militante na terra e a igreja adormecida no purgatório. [39] Como a igreja militante continha tanto trigo quanto joio e como ninguém podia saber ao certo, nesta vida, quem era quem, nem a afiliação à igreja institucional, nem a posse de qualquer cargo clerical garantia que alguém passasse a ser membro da igreja invisível, cujo “abade-chefe” é Cristo. Portanto, era possível estar na igreja sem ser da igreja. Wycliffe aplicava esse conceito diretamente ao papado: mesmo os papas podiam estar entre os réprobos, e nesse caso não deveriam ser obedecidos. [40] Quase no fim de sua vida, Wycliffe repudiou o sistema papal como um todo e exigiu sua abolição.

Se a correlação que Wycliffe fazia entre a predestinação e a eclesiologia mostrou-se uma desmoralização para a supremacia papal na Inglaterra, ela ateou um movimento reformista na Boêmia, com o ímpeto do martírio de Hus. Hus não repetia simplesmente a doutrina de Wycliffe, mas permanecia na tradição dos reformadores checos que sublinhavam a pregação, o estudo das Escrituras e a eliminação dos abusos clericais. Ele não ensinava, como Wycliffe era acusado de fazer, que os sacramentos administrados por um sacerdote pecaminoso não tinham eficácia. Insistia, entretanto, que os sacerdotes e os papas perversos – presumivelmente entre os praesciti, com base no princípio de “pelos frutos os conhecereis” – não deveriam ser obedecidos. A propósito do cargo de papa, ele escreveu: “A autoridade de Pedro permanece no papa, desde que ele não se afaste da lei do Senhor Jesus Cristo“. [41] O princípio da discriminação moral serviu para cortar tanto as pretensões papais quanto os privilégios clericais. O que Hus pedia não era a abolição da igreja institucional, nem ainda a separação entre o sagrado e o impuro (conforme creram os hussistas posteriores), mas a reforma da igreja baseada no exemplo de Cristo e na simplicidade apostólica.

Tanto Wycliffe quanto Hus foram reformadores essencialmente morais, tendo usado o conceito de predestinação para minar as reivindicações eclesiásticas de uma hierarquia corrupta. O apelo deles à igreja invisível, como também sua avaliação das Escrituras como norma superior de doutrina, proporcionaram uma alternativa crítica para o curialismo e para o conciliarismo. Eles legaram aos reformadores do século XVI a tensão não-resolvida entre um moralismo rígido e a verdadeira igreja dos eleitos.

Os Franciscanos Espirituais
Uma das maiores forças dissidentes da baixa Idade Média foi o ramo radical da ordem franciscana, os espirituais, como se autodenominavam, opondo-se aos conventuais transigentes. O poder de seus apelos brotou de suas fontes: o ideal de Francisco da pobreza absoluta e a filosofia da história apresentada por Joaquim Fiore (m. 1202), que eles aplicaram à sua própria ordem e época. Combinados, esses elementos resultaram numa crítica explosiva à igreja da época.

Joaquim dividiu a história em três eras, associadas respectivamente ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo. O alvorecer da Terceira Era seria anunciada pelo aparecimento de uma nova ordem de homens espirituais descalços, que se oporiam à falsa hierarquia da igreja e preparariam o caminho para um milênio de paz que se estenderia até o juízo final. Os franciscanos espirituais, exacerbados por suas lutas com o papado, que se aliava aos conventuais na discussão sobre a pobreza absoluta, identificaram-se como essa nova ordem. Eles não hesitaram em chamar aos papas que se opuseram a eles, Bonifácio VIII e João XXII em particular, de anticristos. De sua parte, a igreja foi rápida em sua reação contra os espirituais. “A pobreza é grandiosa“, disse o Papa João, “mas a integridade é mais grandiosa, e a obediência, o bem maior“. [42] Em 1318, quatro espirituais foram julgados pela Inquisição e queimados vivos em Marselha. Por serem um movimento de protesto dentro da igreja, os espirituais foram irremediavelmente esmagados. A influência deles continou em vários grupos sectários no sul da França e da Itália.

A história dos espirituais é cercada de ironia. Francisco, que desejava consertar a igreja, deu à luz um movimento que, sendo fiel a seu ideal, desintegrou-a gravemente. Dessa forma, “o conceito de Cristo como homem tornou-se o mais poderoso desafio a uma igreja divina“. [43] Outra ironia é que Pedro João Oliva, um dos primeiros líderes dos franciscanos espirituais, asseverava que certos decretos papais que defendiam a doutrina de pobreza dos espirituais (principalmente a bula Exiit qui seminat, 1279) eram inerrantes e infalíveis! Esse argumento era dirigido precisamente contra as tentativas papais posteriores de evitar o ensino anterior. Assim, como Brian Tierney demonstrou, a doutrina da infabilidade papal, arma tão mortal no arsenal do curalismo passado, foi originariamente um esforço para controlar os excessos da hierarquia papal.

Da mesma forma que Wycliffe e Hus opuseram-se à igreja empírica de sua época com o conceito de uma igreja invisível dos eleitos, assim também os franciscanos espirituais ofereceram o ideal da igreja do futuro, a igreja da vindoura Terceira Era do Espírito, da qual eles eram pioneiros. No final da Idade Média, a intensidade das expectativas e dos cálculos escatológicos aumentou. Essa “busca do milênio” continuou até a Reforma, especialmente entre os reformadores radicais que, a esse respeito, eram herdeiros do legado de Joaquim e dos franciscanos espirituais.

Os Valdenses
Enquanto os espirituais esperavam ansiosamente a igreja da nova era vindoura, os valdenses, destituídos de fervor apocalíptico, voltaram em busca da ecclesia primitiva, modelando suas congregações pela simplicidade da igreja primitiva. Os valdenses remontavam sua origem a um Valdès ou Valdo (mais tarde chamado “Pedro”, para mostrar seu vínculo com o apóstolo Pedro), que abandonou sua carreira de rico mercador por uma vida de pregador mendicante. [44] Os “Pobres de Lião”, como eram chamados os primeiros adeptos, logo conquistaram ampla aceitação entre as classes mais baixas. O movimento espalhou-se rapidamente pela maior parte da Europa: da França e da Itália para a Suíça, para a Alemanha e até para a Boêmia, onde houve uma curiosa mistura de conceitos valdenses e hussitas. Por se haverem despojado dos bens terrenos, a exemplo do próprio Cristo, os valdenses eram às vezes chamados de nudi nudum Christum sequentes, os nus seguidores de um Cristo nu. [45]

A visão dos valdenses acerca da igreja era caracterizada por uma tendência fortemente perfeccionista e uma predisposição anti-sacerdotal. Eles acreditavam que a Igreja Romana havia perdido toda sua autoridade espiritual quando o Papa Silvestre I, no século IV, recebeu por dádiva uma propriedade e poder terreno do Imperador Constantino. [46] Apenas os sacerdotes valdenses, conhecidos por perfecti, poderiam ouvir uma confissão ou dar absolvição, já que somente eles eram limpos de pecado. Os valdenses, portanto, muito mais do que Wycliffe ou Hus, ligavam a eficácia dos sacramentos à qualidade moral dos sacerdotes. Nesse sentido, eles representam um ressurgimento do princípio donatista contra o qual Agostinho havia lutado. Seu anti-sacerdotalismo levou-os a eliminar de sua adoração vários rituais comuns à Igreja Romana. Dias santos, dias de festa, relíquias, peregrinações, indulgências e até a crença no purgatório – tudo isso foi varrido por se tratar de excrescências maléficas da falsa igreja.

Os valdenses tiveram condições de sobreviver às freqüentes perseguições por causa de seu modelo separatista de igreja e devido à sua prática de culto clandestino. A afinidade manifesta que tinham com o movimento protestante tornou-os os candidatos principais à conversão. De fato, na Reforma, muitos dos valdenses uniram-se à Igreja Reformada sem perder a própria identidade. [47] Eles continuaram a florescer como a Chiesa Evangelica Valdese até hoje.

Teologias em Constante Mudança – A partir do levantamento acima apresentado acerca da religiosidade e da eclesiologia da baixa Idade Média, deve ficar claro que a igreja, nas vésperas da Reforma, encontrava-se cercada de diversos modelos de espiritualidade e de comunidade cristã. A antiga idéia de que a Reforma destruiu completamente a impertubável unidade de uma cristandade indivisível deve ser descartada, levando-se em conta o que um historiador chamou de “a pluralidade fértil” dos séculos XIV e XV. [48] Cada um dos quatro reformadores que examinaremos neste livro (Martinho Lutero, Ulrich Zuínglio, João Calvino e Menno Simons) foi moldado pelas contracorrentes que caracterizavam o desenvolvimento teológico desde a morte de Tomás de Aquino (1274) até a de Gabriel Biel (1495). Um acompanhemtno completo desse período controvertido exigiria uma obra à parte. Aqui, apenas introduziremos várias das principais tendências com as quais, de uma maneira ou de outra, Lutero, Zuínglio, Calvino e Menno tiveram de lutar.

O Escolasticismo
O termo escolaticismo refere-se à teologia das escolas (scholae). Nos séculos desde a tomada de Jerusalém pelos invasores islâmicos (638) até sua retomada pelos cruzados cristãos (1099), a teologia era basicamente trabalho dos monges, cujo estudo da Bíblia, dos pais da igreja e da literatura clássica fazia parte de sua devoção à vida contemplativa. Anselmo da Cantuária (1033-1109) foi chamado de “o ápice do gênio escolástico primitivo e o fruto mais maduro da escola monástica”. [49] De fato, Anselmo está na encruzilhada das culturas monásticas e escolásticas, pois sua teologia começa com a fé e prossegue através do entendimento indo para a visão. Na teologia, a fé encontra-se sempre por ser compreendia: fides quaerens intellectum. “Não procuro entender para crer, mas creio para entender”. [50] O equilíbrio apropriado entre a fé e a razão, de um lado, e entre a natureza e a graça do outro, viria a ser a hesitante preocupação da teologia escolástica desde a época de Anselmo até a Reforma.

A tentativa de aplicar os instrumentos da razão aos dados da revelação avançou significativamente com Pedro Abelardo (m. 1142) e seu pupilo, Pedro Lombardo (m. 1160), cujos Quatro Livros de Sentenças tornaram-se o padrão para o estudo teológico avançado durante os quatro séculos seguintes. Esse desenvolvimento atingiu seu ápice no século XIII, com o surgimento da grande summae escolástica e dos esforços de teólogos brilhantes como Alexandre de Hales, Alberto Magno e, acima de todos, Tomás de Aquino, por harmonizar a recém-redescoberta filosofia de Aristóteles com o consenso patrístico, conforme tinha sido infiltrado e transmitido desde Agostinho.

Em qualquer aspecto, o sucesso de Aquino foi extraordinário. No prólogo à Summa Theologica, prometeu “seguir o que concerne à doutrina sagrada com tanta brevidade e clareza quanto a matéria permita“. [51] A “brevidade” que se seguiu estende-se em 21 volumes, 631 perguntas, 10000 objeções ou réplicas! O resultado final dessa vasta produção foi mostrar que Deus e toda a criação estavam unidos numa grande corrente de existência. A existência de Deus pode ser provada pela razão natural, não, como pensava Anselmo, por uma análise do próprio conceito de Deus, mas sim pela observação dos efeitos de Deus no mundo visível. Esse é o fundamento das famosas cinco provas – de movimento, de causa, de contingência, de grau e de desígnio – que constituem o argumento cosmológico de Aquino a favor da existência de Deus. Pela razão tão-somente, pode-se saber que Deus é, mas não o que Deus é. A maior parte da Summa relaciona-se com esse último. Aqui, Tomás baseou-se na revelação divina, isto é, as Escrituras interpretadas mediante a tradição, para fornecer o material de sua exposição da Trindade, da encarnação, dos sacramentos e assim por diante. Obviamente, Tomás estava convencido de que havia um aharmonia essencial entre razão e revelação: ambas testemunhavam, cada uma em sua própria esfera, a unicidade de Deus, a unidade de toda a verdade e o fato de que a graça não destrói a natureza, mas sim a aperfeiçoa.

Na atraente percepção tardia da história. Tomás aparece sem rivais como o mais influente teólogo que viveu desde Agostinho até Lutero. Ele tornou-se “São” Tomás em 1323, quando canonizado pelo Papa João XXIII. No Concílio de Trento, sua Summa Theologica foi colocada sobre o altar ao lado da Bíblia. Em 1879, o Papa Leão XIII declarou que o ensino de Tomás seria a filosofia oficial da Igreja Católica Romana. Ainda assim, a vitória final do tomismo não pode obscurecer o fato de que a baixa Idade Média estava longe de uma unanimidade na aceitação da teologia de Tomás. Em 1277, apenas três anos após a morte de Tomás, o bispo de Paris, Stephan Tempier, condenou 219 teses, algumas das quais tinham sido sustentadas por Tomás. Esse foi fundamentalmente um ataque ao aristotelianismo radical que levara alguns pensadores a negar fundamentos da doutrina cristã como a imortalidade a alma e a criação ex nihilo. Enquanto Tomás tentava harmonizar a filosofia de Aristóteles à perspectiva cristã, muitos sentiram que ele não havia logrado êxito total.

No século que se seguiu a Tomás, os dois teólogos mais importantes eram franciscanos: Duns Scotus (m. 1308) e Guilherme de Occam (m. 1347). Ambos os pensadores estavam envolvidos numa importante transmutação da síntese escolástica do século XIII. Podemos apontar três mudanças básicas que tiveram conseqüências significativas para o desenvolvimento da teologia durante o período da Renascença e da Reforma: 1) a da existência para a vontade, como a metáfora básica para a compreensão de Deus; 2) a da metafísica para a meta-história, como meio de entendimento da relação entre Deus e o universo criado e 3) a do discurso ontológico para o lógico, como método de fazer teologia.

Tomás entendera Deus sobretudo relativamente ao esplendor da existência. Um de seus textos-prova favoritos no Êxodo 3.14: “…EU SOU o que SOU…”. Entretanto, por insistir tão fortemente na conexão ontológica entre Deus e a ordem criada, Tomás chegou perto de limitar a liberdade absoluta de Deus, ao enredá-lo em seu próprio sistema, por assim dizer. Duns Scotus reagiu contra essa tendência postulando a primazia da vontade de Deus. Dentro do ser de Deus, a vontade divina tem precedência sobre o intelecto divino. Um ato é virtuoso simplesmente porque Deus ordena que assim seja. Se Deus não está necessariamente atado à grande corrente de existência, está, todavia, livre para ligar-se mediante sua palavra, sua promessa. Tanto uns Scotus quanto Occam fizeram grande uso da distinção entre o poder absoluto de Deus (potentia absoluta) e o poder ordenado de Deus (potentia ordinata). O primeiro diz respeito ao poder pelo qual Deus, hipoteticamente, podia fazer qualquer coisa que não acarretasse a lei da contradição. Deus não poderia tornar dois mais dois igual a cinco, mas poderia (assim acreditava Duns) ter-se encarnado num asno em vez de encarnar-se num homem. Poderia ter decretado que o adultério seria uma virtude e não um mal. Dentro da estrutura da liberdade absoluta de Deus, tornou-se importantíssimo salientar aquilo com que ele se comprometeu por seu poder ordenado. Por esse poder, Deus de fato encarnou-se no homem Jesus, não num asno. Por seu poder ordenado, Deus decretou que a salvação seria dispensada mediante os sacramentos da igreja e do recebimento de méritos. A aliança ou pacto de Deus, isto é, a promessa ou palavra de Deus, é a base da história da salvação. Ainda assim, por seu poder absoluto, Deus pode abolir as regras. Concebivelmente, Deus pode abolir alguém fora do sistema ordenado de méritos e sacramentos – sola fide: apenas pela fé.

A terceira mudança, a saber, das categorias ontológicas para as lógicas, foi levada ao efeito mais coerentemente por Guilherme de Occam. A via moderna (caminho moderno) originou-se de seus ensinos, em oposição à via antiqua (caminho antigo), que remontava aos primeiros escolásticos, como Tomás. Occam negava a existência de fato dos conceitos universais, ressaltando, em vez disso, o caráter deles como nomes (nomina) ou constructos lógicos. O “nominalismo” que se desenvolveu dessa posição centrava-se nos elementos individuais da experiência em seu sentido concreto e em sua realidade contingente, e não em sua condição ontológica numa pretensa ordem de existência. Tal perspectiva resultou numa posterior constrição da esfera da razão. Não era mais possível remontar, como Tomás fez, a partir dos efeitos de Deus no mundo, à existência de Deus como Força Motora, Primeira Causa e assim por diante. Esse desenvolvimento implicou a morte da teologia natural como fora apresentada pelos mestres escolásticos. A existência de Deus e a imortalidade da alma eram artigos da fé exatamente iguais às doutrinas da Trindade e da encarnação. Steven Ozment descreveu o impacto dessas mudanças e a cosmovisão de Occam na vida religiosa da baixa Idade Média.

Insistindo tão firmemente na vontade de Deus e não em sua existência, Occam criou as condições para uma nova ansiedade espiritual – não a possível inexistência de Deus, mas a suspeita de que ele poderia deixar de cumprir sua palavra; de que não se poderia confiar no que ele tinha prometido; de que o poder por trás de todas as coisas poderia por fim se mostrar não-confiável e não-amistoso; de que Deus, em suma, poderia ser um mentiroso. Não a existência de Deus, mas sua bondade; não a racionalidade da fé, mas a capacidade de crer em Deus – esses se tornaram problemas espirituais de relevo. [52]

O Misticismo
No início do século XV, Jean Gerson, reitor da Universidade de Paris e um dos líderes do movimento conciliar, distinguiu três caminhos para o conhecimento de Deus. O primeiro, o da teologia natural, discernia a obra de Deus na criação e buscava entender o Criador aplicando o uso da razão humana ao mundo finito. O segundo, o da teologia dogmática, investigava as fontes da revelação especial de Deus nas Escrituras, nos credos e na tradição da igreja. O terceiro caminho era a teologia mística. Por esse meio, a alma era, por assim dizer, “arrebatada para além de si mesma” e recebia uma experiência de Deus intuitiva e às vezes extática. [53] Desde o arrebatamento de Paulo ao terceiro céu (2 Co 12.1-4), passando pela recepção no corpo de Francisco dos estigmas, as marcas da paixão de Cristo, até a exposição de Bernardo acerca do Cântico dos Cânticos como a união íntima da alma com Cristo, o noivo, a experiência mística havia sido um amparo da espiritualidade cristã. De fato, era possível que a mesma pessoa fosse um expoente nos três tipos de teologia. Tomás de Aquino é um exemplo disso. Seus escritos escolásticos mostram que ele era um mestre tanto da teologia dogmática quanto da natural; e, perto do final de sua vida, sem concluir sua grande Summa Theologica, ele foi possuído de uma profunda experiência mística. Conta-se que ele disse: “Vi aquilo que faz tudo que já escrevi e pensei parecer pequeno para mim“. [54]

Os estudiosos identificaram pelo menos duas tradições da teologia mística na Idade Média. A primeira é o misticismo voluntarista. Aqui, a ênfase é na conformidade da vontade humana com a vontade de Deus, mediante os sucessivos estágios de purgação, iluminação e contemplação, conforme Boaventura ensinou em seu clássico trabalho Itinerarium Mentis ad Deum [A Viagem da Mente em direção a Deus]. [55] Na maior parte, esse enfoque à vida mística apresentava poucos desafios às estruturas ortodoxas da vida da igreja. Por ser “segura”, essa abordagem teve uma influência maior na formação da religiosidade popular, como demonstra o sucesso de Imitação de Cristo, de Tomás de Kempis.

Uma linha mais mordaz, o misticismo ontológico, enfatizava muito mais intensamente a desconexão entre Deus e a alma. A versão mais intelectualmente refinada desse tipo de teologia mística foi apresentada por Meister Eckhan (m. 1327), teólogo dominicano cujas idéias heterodoxas foram desenvolvidas numa série de sermões pregados a freiras. Ele proclamava que bem no íntimo de cada indivíduo havia um “abismo da alma” (Seelenabgrund), uma centelha da vida divina que mantinha a possibilidade de união com Deus ou a absorção nele. Somente pelo processo doloroso de desligamento de si mesmo e de todas as outras criaturas – Eckhart chamava tal processo de Gelassenheit, “um deixar-se solto” – poderia ocorrer o momento da redenção final, aquele instante quando o Filho eterno nasceria dentro da alma. Para alguns, parecia que a doutrina de Eckhart acerca do nascimento do Filho eterno dentro da alma levava-o a negar a historicidade do nascimento humano de Jesus ou, ao menos, a menosprezar sua importância salvífica. Mais perigosamente ainda, a teologia mística de Eckhart parecia levar em consideração um “fim da linha” para os canais estabelecidos da graça sacramental. Em outras palavras, o misticismo ontológico aplicou o poder absoluto de Deus à alma individual, à custa do poder ordenado por Deus, mediado pelas ministrações sacerdotais da igreja. As autoridades eclesiásticas não demoraram para reconhecer o caráter potencialmente explosivo da teologia de Eckhart. Ele foi acusado de heresia, ataque que negou, dizendo: “Eu posso errar, mas não posso ser um herege – porque o primeiro tem a ver com a mente e o segundo, com a vontade!“. [56] Ainda assim, Eckhart foi condenado, embora postumamente, em 1329, por João XXIII, o mesmo papa que seis anos antes havia canonizado Tomás de Aquino.

As idéias de Eckhart não morreram com sua condenação. Sua teologia foi traduzida em linguagem popular por seus discípulos, Johannes Tauler e Heinrich Suso. Alguns místicos medievais posteriores levaram sua piedade a extremos excêntricos. Suso foi um asceta austero que gravou o nome de Jesus em sua pele, sobre o coração. Tauler tendia a reduzir os aspectos mais questionáveis da doutrina de Eckhart acerca da união mística da alma com Deus.

De uma forma ou de outra, as tradições místicas da baixa Idade Média continuaram sendo fonte vital de vida espiritual e de reflexão teológica até a Reforma e, na verdade, também durante esse período. O primeiro livro que Lutero publicou foi uma edição dos sermões de Tauler, a que chamou de Theologia Deutsch [Teologia Alemã]. Como veremos, o misticismo deu a Lutero o arcabouço que o possibilitou lançar sua crítica à doutrina medieval da justificação, embora ele não tenha conseguido chegar à sua própria formulação madura dessa doutrina central até ter abandonado as premissas básicas do misticismo ontológico, pelo menos. [57] O espiritualismo refinado de Zuínglio, seu desdém pela materialidade na religião, lembra o temperamento dos místicos, com sua ênfase na imediação da graça, na apropriação direta e pessoal de Cristo pela alma. Calvino também, talvez o mesmo místico de nossos quatro reformadores, chegou perto de uma compreensão mística em sua doutrina da presença espiritual verdadeira de Cristo na Eucarístia. Calvino poderia muito bem ter feito a seguinte oração, que na realidade está na Imitação de Cristo:

Tu, meu Senhor Deus, meu Senhor Jesus Cristo, Deus e Homem, estás aqui completamente presente no sacramento do altar, onde o fruto da saúde eterna existe em abundância, sempre que és digna e devotamente recebido. [58]

Menno desaprovou especificamente as revelações místicas. “Não sou nenhum Enoque“, ele escreveu, “não sou nenhum Elias. Não sou alguém com visões […] ou inspirações angelicais.” [59] Aqui, Menno estava-se posicionando contra certos anabatistas e espiritualistas que usavam suas experiências místicas pessoais como um anteparo para evitar a obediência rigorosa à palavra escrita de Deus. Ainda assim, Menno estava familiarizado com uma herança mística mais ampla da baixa Idade Média, baseando-se nela em sua interpretação positiva da vida cristã. Nenhum dos reformadores tomou sem reservas as tradições místicas da Idade Média, mas a teologia de cada um deles não pode ser entendida à parte de um intenso desejo por uma senação de imediação divina que suscitava e caracterizava a visão mística.

O Humanismo
Se o misticismo era uma “teologia de todo o mundo”, que estendeu a possibilidade de união íntima com Deus a clérigos e leigos, príncipes e camponeses, homens e mulheres, indistintamente, o humanismo, por sua vez, foi um movimento de reforma que se originou com a elite intelectual da Europa, tendo sido dominado por ela. O próprio termo humanismo, hoje tão livremente jogado de um lado para o outro, referia-se nos séculos XV e XVI não tanto a uma filosofia universal de vida quanto a um método particular de aprendizado com base na redescoberta e no estudo das fontes clássicas da antigüidade, tanto pagã, isto é, romana e grega, quanto cristã. Dessa forma, o humanismo do período da Renascença e da Reforma estava muito mais próximo do que entendemos por humanidades atualmente. Ad fontes! – de volta às fontes! – era o mote dos estudiosos humanistas, cujo trabalho abriu novas perspectivas na história, na literatura e na teologia.

Até certo ponto, o humanismo foi um movimento de reação contra o escolasticismo predominante naqueles dias. Erasmo, que havia estudado teologia escolástica na Universidade de Paris, ridicularizou em seu Elogio da Loucura os seguintes excessivamente minuciosos dos teólogos da época:

Então há os teólogos, grupo notavelmente arrogante e melindroso. […] Eles interpretam os mistérios ocultos como lhes convém: como o mundo foi criado e planejado; por que canais a mancha do pecado infiltrou-se na posteridade; de que maneira, em que medida e em quanto tempo Cristo foi formado no ventre de Maria; como, na Eucaristia, os acidentes podem subsistir sem lugar estabelecido. Mas esses tipos de questões têm sido discutidos exaustivamente. Há outros tópicos mais dignos de teólogos importantes e iluminados (como chamam a si mesmos), que podem realmente incitá-los à ação se forem enfrentados. Qual foi o momento exato da geração divina? Há diversas filiações em Cristo? É uma proposição plausível que Deus Pai pudesse odiar seu Filho? Poderia Deus ter tomado a forma de uma mulher, de um demônio, de um burro, de uma abóbora ou de uma pederneira? Nesse caso, como uma abóbora poderia ter pregado sermões, realizado milagres e sido pregada na cruz? E o que Pedro teria consagrado se o tivesse feito quando o corpo de Cristo ainda estava na cruz? E mais, Cristo poderia ao mesmo tempo ter sido chamado de homem? Teremos permissão de comer e beber após a ressurreição? Estamos tomando as devidas precauções contra a fome e a sede enquanto há tempo. Esses sutis refinamentos de minúcias tornam-se ainda mais sutis mediante todas as diferentes linhas de argumento escolástico, tanto que você sairia mais facilmente de um labirinto do que das tortuosas obscuridades dos realistas, nominalsitas, tomistas, albertistas, occamistas e scotistas – e não mencionei todas as divisões, somente as principais.

Erasmo ainda acrescentou que os próprios apóstolos precisariam da ajuda de outro Espírito Santo se tivessem de debater com “nossa nova geração de teólogos”. [60]

O problema do escolasticismo não era sua ênfase sobre o aprendizado, mas sim suas especulações áridas, que levavam mais a um labirinto intelectual do que a uma reforma da igreja e da sociedade. A philosophia Christi, “filosofia de Cristo”, como Erasmo chamava seu enfoque da vida cristã, pressupunha a reforma pela educação, educação que valorizava a retórica sobre a dialética, os clássicos sobre os escolásticos e a ação no mundo sobre a reclusão monástica.

Em certo nível, a colheita humanista de fontes clássicas levou a uma crítica radical das instituições eclesiais e da teologia tradicional. Lorenzo Valla (m. 1457) provou, mediante uma análise lingüística, que a chamada Doação de Constantino, um documento no qual grande parte da reivindicação papal sobre a autoridade temporal estava baseada, era de fato uma forjadura do século IX. Em outro aspecto, Valla desafiou a tradução tradicional da palavra grega metanoia como “fazer penitência”. Ele demonstrou que o termo realmente significava “arrependimento”; referia-se a uma mudança genuína da mente e do coração, não à atuação ritual requerida pelo sacramento da penitência. Erasmo incorporou a tradução de Valla em sua edição de 1516 do Novo Testamento grego. Por sua vez, Lutero encontrou nessa nova leitura do texto original uma base para seu ataque frontal à prática das indulgências. Na primeira das Noventa e Cinco Teses de Lutero, lemos: “Quando nosso Senhor e Mestre Jesus Cristo disse arrependei-vos’ [Mt 4.17], queria que a vida inteira dos crentes fosse de arrependimento“. [61]

Talvez a contribuição mais positiva dos eruditos humanistas à renovação religiosa do século XVI tenha sido a série de edições críticas da Bíblia e dos pais da igreja, amplamente disseminadas graças ao sucesso fenomenal da imprensa. O pai da igreja favorito de Erasmo era Jerônimo, mas a fonte patrística mais influente para a teologia reformada sem dúvida foi Agostinho. De fato, nos séculos imediatamente anteriores à Reforma, houve algo como uma “renascença agostiniana”, gerada em parte por um renovado interesse na teologia de Agostinho dentro da própria Ordem Agostiniana e pela atração que Agostinho provocava nos primeiros humanistas, tais como Petrarca, que foi atraído especialmente pelas Confissões. Sempre que lia essa obra, ele dizia: “Parece-me que não estou lendo a história de outra pessoa, mas o relato da minha própria peregrinação“. [62]

O impacto do humanismo na Reforma ainda é discutido por especialistas no período. Sem o apoio anterior dos humanistas a Lutero, principalmente seu aliciamento das Noventa e Cinco Teses, é duvidoso que o ataque de Lutero contra Roma tivesse-se tornado a cause célebre que incendiou as mentes e as energias de toda a Europa. Tanto Zuínglio quanto Calvino estavam imersos nos clássicos ambos devotos do reavivamento humanista do saber, antes de se tornarem reformadores. Essa perspectiva continuou informando seus estudos bíblicos e seus esforços reformadores em Zurique e Genebra. Menno, também, que teve um menor treinamento formal do que os outros, também não deixou de ser influenciado pelo movimento humanista, e citou com aprovação diversos escritos de Erasmo. A despeito da importância do humanismo como uma preparação para a Reforma, a maioria dos humanistas, e principalmente Erasmo entre eles, nunca alcançou nem a gravidade da condição humana, nem o triunfo da graça divina, o que marcou a teologia dos reformadores. O humanismo, assim como o misticismo, foi parte da estrutura que possibilitou aos reformadores questionar certas suposições da tradição recebida, mas que em si mesma não era suficiente para fornecer uma resposta duradoura às obsessivas perguntas da época.

1. Citado em Johan Huizinga, The Waning of the Middle Ages, p. 36.

2. Paul Tillich, The Courage to Be (New Haven: Yale University Press, 1952), pp. 57-63. Cf. também a abordagem de Tillich acerca da baixa Idade Média, em seu A History of Christian Thought, Carl E. Braaten, ed. (Nova Iorque: Simon and Schuster, 1967), pp. 227-233. Outros eruditos também aplicaram a categoria da ansiedade a esse período. Veja em especial o discernente artigo de William J. Bouwsma, “Anxiety and the Formation of Early Modern Culture”, in: After the Reformation: Essays in Honor of J. H. Hexter, Barbara C. Malament, ed. (Filadélfia: University of Pennsylvania Press, 1980), pp. 215-246.

3. Robert E. Lerner, The Age of Adversity: The Fourteenth Century (Ithaca, N. I.: Cornell University Press, 1968), pp. 10-11.

4. Joseph Lortz, How the Reformation Came (Nova Iorque: Herder and Herder, 1964), p. 6.

5. Quanto à importância dessa invenção, veja J. R. Hale, “Gunpowder and the Renaissance: An Essay in the History of Ideas”, From the Renaissance to the Counter-Reformation: Essays in Honor of Garrett Mattingly, Charles H. Carter, ed. (Nova Iorque, Random House, 1965), pp. 13-44; Lynn T. White, Jr., “Tools and Civilization”, Perspectives in Defense Management 24 (1975-1976), pp. 33-42.

6. Michael Seidlmayer, Currents of Medieval Thought (Oxford: Blackwell, 1960), p. 126; cf. também Huizinga, pp. 138-151.

7. Henri Meylan e Alain Dufour et al., eds), Correspondence de Théodore de Bèze (Genebra: Droz, 1960- ), III, p. 45 (carta n.o 156 para Melchior Wolmar, 12 de maio de 1560), trad. em Henry Baird, Theodore Beza (Nova Iorque: G. P. Putnam’s Sons, 1899), p. 355.

8. Comm. Hb 2.15: CNTC 2, pp. 485-493.

9. Cf. Norman Cohn, The Pursuit of the Millenium (Nova Iorque: Oxford University Press, 1961), pp. 127-147; Gordon Leff, Heresy in the Later Middle Ages (Nova Iorque: Barnes and Noble, 1967), II, pp. 485-493.

10. As relíquias estavam especialmente em voga no século XV e início do XVI. A catedral de colônia alegava abrigar os restos mortais dos três magos. A igreja em Aachen ostentava as vestimentas da virgem Maria e o pano ensangüentado sobre o qual a cabeça cortada de João Batista havia jazido. A igreja em forma de castelo situada em Wittenberg (a igreja de Lutero!) continha a valiosa coleção do Príncipe Frederico, o Sábio, a qual incluía: 35 pedaços da cruz verdadeira, um frasco do leite da Virgem Maria, uma lasca da vara de Moisés e 204 partes dos corpos dos Sagrados Inocentes. Cf. John P. Dolan, History of the Reformation (Nova Iorque: Descle Company, 1965), pp. 204-205.

11. Seidlmayer, p. 141; “Testamentum Regis Henrici Octavi”, Thomas Rymer, Foedera(Londres, 1713), XV, p. 110.

12. Steven E. Ozment, The Reformation in the Cities (New Haven: Yale University Press, 1975), pp. 15-46.

13. Ibid., citando de Johannes Geffken, Bilderkatechismus des funfzehnter Jahrhunderts (Leipzig: Weigel, 1855).

14. Ibid.

15. Cf. a seguinte avaliação: “Essas atitudes ansiosas e edificantes, que denunciam carência espiritual e a condição miserável da existência, foram de uma intensidade maior e mais abrangente do que antes desse período”. Bernd Moeller, “Piety in Germany Around 1500”, The Reformation in Medieval Perspective, Steven E. Ozment, ed., p. 56.

16. Dolan, p. 201.

17. Thomas More, The Workers of Sir Thomas More… wrytten by him in the English tongue (Londres: s. e., 1557), pp. 337-338, citado em A. G. Dickens, The English Reformation (Nova Iorque: Schocken Books, 1964), pp. 5-6.

18. Ozment, Reformation in the Cities, p. 28, citando o Heidelberger Bildenhandschrift, Geffken, apêndice 8.

19. Esse é o significado principal da palavra excêntrico. Quanto ao contexto nominalista da revolução copernicana, veja o fascinante artigo de Heiko A. Obermam, “Reformation and Revolution: Copernicus’ Discovery in an Era of Change”, em The Nature of Scientific Discovery, Owen Gingerich, ed. (Washington, D.C.: Smithsonian Institution Press, 1975), pp. 134-169.

20. Extraído do discurso de Ulisses sobre “graus”, em Shakespeare, Troilus and Cressida. The Complete Works of William SHakespeare, W. G. Clark e W. A. Wright, eds. (Nova Iorque: Nelson Doubleday, Inc., s. d.), p. 696.

21. Este número vem de Louis de Paramo, um inquisidor siciliano, que escreveu um tratado sobre a origem e o progresso da Inquisição, Origin and Progress of the Inquisition (1597). Cf. Philip Schaff, History of the Christian Church (Nova Iorque: Charles Scribner’ s Sons, 1910), VI, p. 529. Quanto às diversas teorias a respeito da feitiçaria, veja H. C. Erik Midelfort, “Were There Really Witches?”, in: Transition and REvolution, Robert M. Kingdon, ed. (Minneapolis: Burgess Publishing Co., 1974), pp. 89-233.

22. Cf. Ian Siggins, Luther and His Mother (Filadélfila: Fortress Press, 1981), pp. 32-44. A crença na feitiçaria, obviamente, não se restringia aos católicos. O teólogo puritano William Perkins publicou Discourse of the Damned Art of Witchcraft [Exposição da Arte Maldita da Feitiçaria] e 29 bruxas foram executadas no período de 1544-1545 por causarem uma epidemia na Genebra de Calvino. Cf. Midelfort, p. 189.

23. Lucien Febvre, “The Origin of the French Reformation: a badly-put question?”, in: A New Kind of History, Peter BUrke, ed. (Nova Iorque: Harper and Row, 1973); publicado pela primeira vez em Revue historique (1929).

24. Quanto aos conceitos medievais posteriores acerca da igreja verdadeira, veja Gordon Leff, “The Making of the myth of a True Church in the Later Middle Ages”, in: Journal of Medieval and Renaissance Studies 1 (1971), pp. 1-25; Scott H. Hendrix, “In Quest of the Vera Ecclesia: The Crises of Late Medieval Ecclesiology”, Viator 7 (1976), pp. 347-378.

25. A revolução constantina, que os anabatistas reconheceriam como a “queda” decisiva da igreja, era citada pelos primeiros reformadores, tais como Bernardo de Claravel, como um momento crítico nas propriedades do papado. Veja Bernardo, Sermones in Cantica canticorum 33.14-16 (PL 183, cols. 958-959). Cf. também o lamento de Dante: “Ah, Constantino, que calamidade marcou o momento – não da sua conversão, mas da taxa que o primeiro Pai rico tomou de você como dote!”. Inferno, Canto XIX, 109-111: The Inferno, trad. por John Ciardi (Nova Iorque: New American Library, 1954), p. 170.

26. Citado em Brian Tierney, The Crisis of Church and State, 1050-1300 (Englewood Cliffs, N. J.; Prentice Hall, 1964), pp. 13-14.

27. Ibid., pp. 49-50.

28. Ibid., p. 132.

29. Ibid., p. 189.

30. Purgatorio, Canto XVI, 127-29, trad. por John Ciardi (Franklin Center, Penn.: The Franklin Library, 1983; ed. original, 1961), p. 174. Uma visão papal da igreja continuou a ser defendida. Cf. a declaração de Panormitano (falecido em 1453): “O que quer que Deus possa fazer, o papa pode fazer”; citado em Patrick Granfield, The Papacy in Transition (Nova Iorque: Doubleday, 1980), p. 44.

31. Citado de L. Pastor, History of the Popes (Londres: Trübner and Co., 1891), I, pp. 202-203.

32. Veja o magistral estudo de Brian Tierney, Foundations of Conciliar Theory (Cambridge: Cambridge University Press, 1955), esp. pp. 1-20, 47-67.

33. Ibid., p. 248.

34. “Execrabilis”, in: Grabriel Biel, Defensorium Obedientiae Apostolicae et Alia Documenta, Heiko A. Oberman et al., eds. (Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 1968), pp. 225-226. Cf. também a discussão de Oberman acerca dessa bula em Forerunners of the Reformation, pp. 212-215.

35. John M. Todd, Luther: A Life (Nova Iorque: Crossroad, 1982), p. 153. Quanto ao relacionametno entre Lutero e Hus, veja Scott H. Hendrix, Luther and the Papacy: Stages in a Reformation Conflict (Filadélfia: Fortres Press, 1981), pp. 85-94; “‘We Are All Hussites’? Hus and Luther Revisited”, in: Archiv für Reformationsgeschichte 65 (1974), pp. 134-161.

36. No final de 1520, Lutero protestou da seguinte forma: “Non recte faciunt, qui me Hussitam vocant”.

37. E. Gordon Rupp, “Christian Doctrine from 1350 to the Eve of the Reformation”, in: A History of Christian Doctrine, Hubert Cunliffe-Jones, ed. (Edimburgo: T. and T. Clark, 1978), p. 292; John Wyclif, English Works, F. D. Matthew, ed. (Londres> Trübner and Co., 1880), pp. 96-104, 477.

38. John Hus, “On the Church”, in: Oberman Forerunners, p. 218.

39. John Wyclif, De Ecclesia, Johann Loseth, ed. (Londres: Trübner and Co., 1886), p. 8: “Sic non dicimus ecclesiam catholicam nisi que in se continet ista tria: partem in celo triumphantem, partem, in purgatorio dormientem et partem in terris militantem”.

40. Ibid., p. 32: “Item, iuxta sepe dicta non sic asserert quod sit predestinatus, eo quod non est de substancia fidei catholice quod iste sit predestinatus […] sed si non sit predestinatus, non est capitaneus in ecclesia sancta Dei”.

41. S. Harrison Thomson, ed. Magistri Johannis Hus Tractatus de ecclesia (Boulder, Colo.: University of Colorado Press, 1956), p. 169. Quanto à eclesiologia de Hus, veja Matthew Spinka, John Hus’ Concept of the Church (Princeton, N. J.: Princeton University Press, 1966); Leff, Heresy, II, pp. 655-685.

42. Ibid., I, p. 208. Quanto à influência de Joaquim sobre os espirituais, veja Marjorie Reeves, Joachim of Fiore and the Prophetic Future (Nova Iorque: Harper and Row, 1976).

43. Leff, “The making of the myth”, p. 2.

44. Quanto a relação entre os movimentos hussita e valdense, veja Amadeo Molvar, “Les vaudois et la réforme tchéque”, Bolletino delss Societá di Studi Valdesi 103 (1958), pp. 37-51.

45. Quanto a esse tema como expressão característica de grupos reformadores no século XII, veja GIles Constable, “Nudus Nudum Christum Sequi: Parallel Formulas in the Twelfth Century”, in: Continuity and Discontinuity in Church History: Essays Presented to George Huntston Williams on teh Occasion of His 65th Birthday, F. F. Church e Timothy George, eds. (Leiden: E. J. Brill, 1979), pp. 83-91.

46. Lorenzo Valla, humanista do século XV, provou pela análise lingüistica que a “doação de Constantino” foi uma mentira. Conseqüentemente, era usada, numa maneira bastante diferente daquela dos valdenses, como um realce para o argumento da supremacia papal.

47. Quanto ao relato da absorção deles pelo protestantismo, veja George H. Williams, The Radicals Reformation (Filadélfia: Westminster Press, 1962), pp. 518-529.

48. Heiko A. Oberman, “Fourteenth Century Religious Thought: A Premature Profile” , in: Speculum 53 (1978), p. 80.

49. David Knowles, The Evolution of Medieval Thought (Nova Iorque: Random House, 1962), p. 98. Quanto às origens monásticas do escolasticismo, veja Jean Leclercq, The Love of Learning and the Desire for God (Nova Iorque: Fordham University Press, 1961).

50. “Neque enim quaero intelligere ut credam, sed credo ut intelligam. Nam et hoc credo: quia ‘nisi credidero, non intelligam’.” Proslogion, 1. S. Anselmi Opera Omnia, F. S. Schmitt, ed. (Edimburgo: Nelson and Sons, 1946), I, p. 100. Significativamente, o famoso argumento ontológico de Anselmo para a existência de Deus encontra-se manifestado em forma de oração.

51. “Haec igitur et alia huiusmodi evitare studentes, tentabimus, cum confidentia divini auxilii, ea quae ad sacram doctrinam pertinet, breviter et dilucide prosequi, secundum quod materia patietur.” Summa Theologiae (Madri: Biblioteca de Autores Cristianos, 1961), I, Prólogo, p. 3.

52. Steven Ozment, The Age of Reform, 1250-1550, pp. 61-62. Quanto a outros relatos desse mesmo período, veja Gordon Leff, Medieval Thought (Chicago: Quadrangle Books, 1958) e The Dissolution of the Medieval Outlook (Nova Iorque: Harper and Row, 1976). Cf. também o útil esboço de David Knowles, “The Midle Ages, 604-1351”, in: A History of Christina Doctrine, Hubert Cunliffe-Jones, ed. (Edimburgo: T. and T. Clark, 1978), pp. 246-286.

53. Veja Gerson, De mystica theologia speculativa, Cons. 2, citado em Francis Oakley, The Western Church in the Later Middle Ages (Ithaca, N. I.: Cornell University Press, 1979), pp. 89-90.

54. Citado em John Ferguson, An Illustrated Encyclopedia of Mysticism (Londres: Thames and Hudson, 1976), p. 196.

55. Bonaventura, The Mind’s Road to God, trad. por George Boas (Indianápolis: Bobbs-Merrill, 1953).

56. Raymond B. Blakney, ed. Meister Eckhart (Nova Iorque: Harper and Row, 1941), p. xxiii.

57. Quanto à questão muito controvertida acerca do débito de Lutero para com a tradição mística, veja Heiko A. Oberman, “Simul Gemitus et Raptus: Luther and Mysticism”, in: Ozment, ed., In medieval Perspective, pp. 219-251.

58. Oakley, p. 108.

59, CWMS, p. 310.

60. CWE 27, pp. 126-127.

61. LW 31, p. 25.

62. Petrarca, citado em Jaroslav Pelikan, Reformation of Church and Dogma (Chicago: University of Chicago Press, 1984), p. 20. Quanto ao reavivamento agostiniano dentro da Ordem Agostiniana, veja David C. Steinmetz, “Luther and the Late Medieval Augustinians: Another Look”, Concordia Theological Monthly 44 (1973), pp. 245-260.

Bibliografia Selecionada

Bentley, Jerry H. Hmanists and Holy Writ. Princeton University Press, 1983. Estudo da erudição do Novo Testamento no Renascimento. Excelentes capítulos sobre Valla e Erasmo.

Cargill-Thompson, W. D. J. “Seeing the Reformation in Medieval Perspective”, Journal of Ecclesiastical History 25 (1974), pp. 297-308. Panorama bibliográfico da literatura contemporânea na área.

Huizinga, Johan. The Waning of the Middle Ages. Nova Iorque: Doubleday, 1949. Publicado originalmetne em holandês, em 1919, este é um estudo indispensável acerca da vida, do pensamento e da arte dos séculos XIV e XV.

Oakley, Francis. THe Western Church in the Later Middle Ages. Ithaca, N.I.: Cornell University Press, 1979. Leva em consideração as forças políticas, sociais, intelectuais e esprituais.

Oberman, Heiko A. Forerunners of the Reformation. Filadélfia: Fortress Press, 1966. Antologia de fontes fundamentais com introduções úteis.

Ozment, Steven E. THe Age of Reform, 1250-1550. New Haven: Yale University Press, 1980. Panorama abrangente do período. Melhor acerca do período medieval posterior do que quanto à Reforma.

Ozmen, Steven E., ed. The Reformation in Medieval Perspective. Chicago: Quadrangle Books, 1971. Valiosa coleção de ensaios escritos por oito respeitados eruditos na área.

Petry, Ray C. Late Medieval Mysticism. Filadélfia: Westminster Press, 1957. Antologia bem organizada de fontes primárias.

Steinmetz, David C. Misericordia Dei: The Theology of Johannes von Stauptiz in tis Late Medieval Setting. Leiden: E. J. Brill, 1968. Apreciação esplêndida de Staupitz e das tradições medievais nas quais ele se baseou.

 

Fonte: Teologia dos Reformadores, Editora Vida Nova, Timothy George

 


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